sexta-feira, 20 de agosto de 2010

Desejo Logo Ex-sisto

Marcos Spagnuolo Souza

marcospagnuolo@uol.com.br

Resumo do capítulo “Desejo Logo Ex-sisto” escrito por Antônio Quinet no livro intitulado “A descoberta do Inconsciente”.

No primeiro momento é importante elaborarmos a diferenciação entre “eu” e “sujeito”. O “eu” é produto da cultura que estamos inseridos, elaborado pelo outro, ou podemos dizer que o “eu” é a mascara que usamos para que as outras pessoas nos vejam como nós queremos que elas nos vejam. O “eu” é como se fosse às insígnias com as quais me paramento para o convívio com os outros da coletividade. Aprofundando, salientamos que o “eu” funciona como barreira ao sujeito do inconsciente.

A respeito do “sujeito” temos duas colocações, sendo a primeira no viés de Descartes e o segundo viés sendo o olhar da psicanálise. Descartes salienta que o “sujeito” é a coisa pensante, o “sujeito” está no pensamento. “Penso logo existo”, assim sendo substancializa o sujeito na coisa que pensa. O “sujeito” para Descartes é uno, inteiro e identificável. O “sujeito” para a psicanálise é o pensamento inconsciente. O “sujeito” é o inconsciente, lá onde falta alguma coisa se encontra o sujeito, é lembrança apagada, vazio de representação, oco, não possui substância, está fora do pensamento. O sujeito é patológico por definição afetado pela estrutura que obedece a uma lógica. O sujeito está no pensamento como ausente, como pensamento barrado. Lá onde penso eu não estou. O sujeito se experimenta como falta-a-ser, pois, não encontra representação simbólica para o seu ser. O inconsciente é o pensamento ausente, o pensamento rejeitado, desútil, no entanto, mesmo sendo rejeitado pelo “eu” ele não cessa de se manifestar, é o saber próprio do “sujeito”.

O “sujeito” é desejo, o “sujeito” é fundamentalmente desejo; desejo de não ser e de não ter, desejo de jamais ser e de jamais ter. O desejo do “sujeito” é indestrutível, inominável, indefinível, irrepresentável, insubstancial, sempre desejo de outra coisa, o pensamento não o define, não há representação própria para o desejo, não tem substância; vazio, aspiração falta. O desejo do “sujeito” é palavra sem significado, ou na palavra sem significado desliza o sujeito.

O “sujeito” se manifesta na hesitação, na dúvida, nos escombros da patologia (doença), caleidoscópios (variedade infinita de aspectos) oníricos (sonho), fantasmagorias (figuras luminosas na escuridão) da ópera (espetáculo) privada, corredores das vesânias (mania, loucura, disparate). Descobrimos o sujeito no pensamento ausente, pensamento barrado. Lá onde penso eu não estou, mas, onde não penso estou. O “sujeito” se manifesta no sintoma. O sintoma é a hesitação, a dúvida, o que se manifesta no intervalo.

O “sujeito” pode ser descoberto na clínica onde o psicanalista solicita o “sujeito”, solicita o “sujeito” do desejo, o sujeito do inconsciente que não responder ao “eu” que não quer saber nada do que o “eu” sabe. O psicanalista não ataca o sintoma, mas, acolhe o sintoma para que ele possa ser desdobrado e decifrado, fazendo emergir o sujeito. Na clínica deve deixar o sujeito bater as asas do desejo. Na clínica o psicanalista se lança no vazio do saber instável (incompleto) que está sempre a ser reconstruído. O ato analítico do psicanalista não possui a rede de segurança do grande Outro.

REFERÊNCIA

QUINET, Antônio. A descoberta do inconsciente. Rio de Janeiro: Zahar, 2008.







Arquitetura do “Eu”

Marcos Spagnuolo Souza

Esse artigo é o resumo do livro escrito por Jung denominado “Aion estudos sobre o simbolismo do Si-Mesmo”.

1 Si-Mesmo

O si-mesmo, em sua totalidade, se situa além dos limites pessoais representando uma totalidade de natureza divina ou celeste. O si-mesmo se acha ligado à imagem e identificado com Deus, não podendo ser captado em sua totalidade devido sua infinitude. O Si-Mesmo é a autoridade que dissipa as dúvidas criando um fato consumado e podemos designar esta instância como vontade de Deus ou como sendo operação das forças da natureza. Comenta Jung (1986:24)

O Si-Mesmo concebido como sendo vontade de Deus, o que implica admitir que as forças naturais são forças divinas, tem a vantagem de a decisão se apresentar, em tal caso, como um ato de obediência como sendo algo planejado por Deus. (...) O homem nunca aparece como um mero observador, mas toma parte nele, mais ou menos voluntariamente, tentando colocar o peso de seu sentimento de liberdade moral no prato da balança da decisão. Entretanto, aqui não se sabe em que redundará a motivação causal, por vezes inconsciente, de sua decisão, que ele considera livre. Tanto poderá ser um ato de Deus quanto uma catástrofe natural.

O si-mesmo é uma estrutura que não ocupa o lugar do “eu”, mas é uma estrutura que inclui o “eu” e mais abrangente que o “eu”. O si-mesmo representa sempre uma situação em que o “eu” se acha incluido. O si-mesmo não pode ser captado em sua totalidade pelo “eu” e o “eu”, podemos dizer, está subordinado ao si-mesmo. O si-mesmo não fica circunscrito ao âmbito da consciência do “eu”, pois seus limites é impossível de ser fixado. Salienta Jung: “O Si-mesmo não é uma grandeza que venha a ocupar o lugar daquela até o momento designada pelo termo “eu”, mas a uma grandeza mais abrangente, que inclua o “eu” (1986:1)

Para os alquimistas o si-mesmo, não está na consciência do “eu”, mas fora dela, e precisamente já em nós; não, porém, “in mente nostra”, e sim naquilo que somos e ainda não conhecemos, isto é, naquele “quid” que precisamos conhecer. Hoje em dia damos-lhe o nome de inconsciente impessoal, distinguindo do inconsciente pessoal e do inconsciente coletivo.

Afirma Joung (1986: 4):

Si-Mesmo ou Personalidade Global não pode ser captada em sua totalidade, denominada de si-mesmo. Por definição o “eu” está subordinado ao si-mesmo. È inclusive notório que o “eu” não é somente incapaz de qualquer coisa contra o si-mesmo, como também é assimilado e modificado, eventualmente, em grande proporção, pelas parcelas inconscientes da personalidade que se acham em vias de desenvolvimento.

O Si-Mesmo não é captado em sua totalidade pelo “eu”, pois ocorreria uma catástrofe psíquica, pois, o “eu” assimila apenas alguns aspectos do Si-Mesmo. A busca do “eu” pelo Si-mesmo é em decorrência da imagem do Si-Mesmo que esta gravada no inconsciente da psique impulsionando o desejo pelo Si-Mesmo. Acrescenta Jung ( 1986: 22)

A imagem da totalidade permanece imersa na inconsciência. É por isto que ela participa, por um lado, da natureza arcaica do inconsciente, enquanto que por outro, na medida em que está contido no inconsciente se situa no continuum espaço-tempo característico deste último. Estas duas propriedades são numinosas e, por isso mesmo, absolutamente determinante para a consciência do eu, que é diferenciada, separada do inconsciente, encontrando-se as referidas propriedades em um espaço e tempo absolutos. Isto se dá por uma necessidade vital.

Destaca Jung (1986) que apesar do Si Mesmo não parecer mais do que uma noção abstrata, contudo é uma noção empírica, antecipada na psique por símbolos espontâneos ou autônomos. São estes os símbolos da quaternidade e dos mandalas, que afloram não somente nos sonhos do homem moderno, que o ignora como também aparece amplamente difundido nos monumentos históricos de muitos povos e épocas. Seu significado como símbolos da unidade e da totalidade é corroborado no plano da história e também no plano da psicologia empírica. “O que parece à primeira vista uma noção abstrata é, na realidade, algo de empírico, que revela espontaneamente sua existência apriorística. A totalidade constitui, portanto, um fator objetivo que se defronta com o sujeito, de modo autônomo.” (Jung, 1986: 29)

No plano da objetividade o Si-Mesmo é representado pelo filho do homem transfigurado, o Filho de Deus que não foi manchado pelo pecado. Cristo é a verdadeira imagem de Deus, a cuja semelhança foi criada nosso homem interior; invisível, incorporal e imortal. Cristo é a imagem perfeita de Deus. O mal é meramente a carência acidental de uma perfeição, ausência do Si-mesmo em nós, ocorrendo uma separação definitiva entre o reino celeste e o mundo de fogo da condenação. Cristo é para nós a analogia mais próxima do si-mesmo e de seu significado. Cristo, é a encarnação do Si-Mesmo.

Conforme Jung (1986) o Si-Mesmo nos sonhos modernos é representado pelo elefante, cavalo, touro, urso, do pássaro branco e preto, do peixe e da serpente. Também ocorre a tartaruga, o caracol, a aranha e o escaravelho. Símbolos vegetais são, principalmente, a flor e a árvore. Dentre os objetos inorgânicos que aparecem com relativa freqüência, devem-se mencionar ainda o monte e o lago. Nos casos em que há menosprezo pela sexualidade, o si-mesmo aparece simbolicamente em forma de falo.

O Si-Mesmo é representado também pela mandala, pelo ouro ou por recipientes herméticos. Jung explica (1986):

A mandala que simboliza o si-mesmo. O si-mesmo simbolizado pelo recepiente hermético, pois este foi escondido, divinamente, por obra da sabedoria do Senhor, da vista das nações, e os que não o conhecem, também ignoram o verdadeiro método. O Ancião diz que se deve procurar mais a visão do que o conhecimento da Sagrada Escritura. Maria, a profetisa, afirma: “Este é o recipiente de Hermes, que os estóicos esconderam (1986: 229) O ouro é outro símbolo do si-mesmo (1986: 252)

Todas as aspirações do “eu” pela perfeição, tomada no último sentido, é não apenas legítima, como também uma característica inata do homem, e uma das mais profundas raízes da civilização. Esta aspiração é, inclusive, tão forte, a ponto de transformar-se em paixão, que tudo submete a seu império. Aspira-se, naturalmente, a uma perfeição em qualquer direção em decorrência do Si-Mesmo que nos atrai. “O Si-Mesmo manifesta-se em nós através da prudência e da justiça, da moderação, da virtude, da sabedoria e da disciplina. O Si-Mesmo em virtude de suas qualidades se manifesta por fim como os “eidos” (idéias) de todas as representações supremas da totalidade e da unidade” (1986: 32).

2 Eu

O “eu” não é um fator simples, elementar, mas complexo; é um fator que, como tal, é impossível descrever com exatidão. Sabemos pela experiência que ele é uma individualidade única constituído por duas bases aparentemente diversas: uma base somática e uma base psíquica. O homem só possui uma visão limitada da fisiologia da sua parte somática e, só conhece uma diminuta parte de sua psique.

O “eu” quando separado de suas raízes (si-mesmo), falta-lhe a ligação com as bases da existência, e neste caso ele secará inevitavelmente. É ai, então, que a Anamnesis é de vital importância. O conto de fadas e o mito expressam processos inconscientes e sua narração produz sempre um revivescimento e uma recordação de seu conteúdo, operando consequentemente uma nova ligação entre a consciência e o inconsciente.

O aspecto somático possui dois viéses, o consciente e o inconsciente, o mesmo ocorrendo com a psíque que é consciente e ao mesmo tempo inconsciente, assim sendo a base somática e psíquica do “eu” é constituída por fatores conscientes e inconscientes.

2.1 Somático

Enfatiza Jung (1986:2) que conhecemos a base somática, partindo da totalidade das sensações de natureza endossomática, as quais, por sua vez, são de caracteres psíquicos e ligados ao eu e, consequentemente, também conscientes. Estas sensações decorrem de estímulos endossomáticos que só em parte transpõem o limiar da consciência. Parte considerável destes estímulos se processa de modo inconsciente, isto é, subliminar. Não há dúvida de que parte considerável dos estímulos endossomáticos é totalmente incapaz de se tornar consciente.

2.2 Psíquico

Base psíquica do “eu”: constituída por fatores conscientes e inconscientes. Estes últimos se dividem em três grupos: 1) o dos conteúdos temporariamente subliminares, isto é, voluntariamente reproduzíveis; 2) o dos conteúdos que não podem ser produzidos voluntariamente (conteúdos que somente podem chegar a consciência a partir de muita fatiga, ou recorrendo até mesmo a meios artificiais) 3) conteúdos totalmente incapazes de se tornarem conscientes (Jung, 1986:2)

A verdadeira portadora e geradora do saber é a psique; e foi justamente esta o que mais se ignorou, durante muito tempo. Ela era considerada um sintoma de reações químicas, um epifenômeno de processos celulares, ocorridos no cérebro; e ela não existiu mesmo, realmente, por algum tempo. (...) Uma das aquisições mais modernas é a consciência de que se deve levar em conta a realidade objetiva do fator psíquico. (...) Para os gnósticos, e é nisto que consistia seu verdadeiro segredo, assim como para os alquimistas, a psique existe como fonte de conhecimento (Jung, 1986:164)

2.3 Consciência Psíquica

Salienta Jung (1986) que é impossível dizer até onde vão os limites do campo da consciência, porque este pode estender-se de modo indeterminado. Empiricamente, porém, ele alcança sempre o seu limite, todas as vezes que toca o âmbito do desconhecido. Este desconhecido é constituído por tudo quanto ignoramos por tudo aquilo que não possui qualquer relação com o eu enquanto centro da consciência. “A consciência é incapaz de abarcar a totalidade, mas é muito provável que a totalidade esteja presente, inconscientemente, no eu. Isto corresponderia a um estado da mais alta perfeição ou integralidade” (Jung, 1986:102).

2.4 Inconsciente Psíquico

Evidencia Jung (1986:5) que o inconsciente é dividido em dois campos: de um lado, o de uma psique extraconsciente cujos conteúdos classificamos de pessoais e, do outro, o de uma psique cujos conteúdos qualificamos de impessoais, ou melhor, coletivos. O primeiro grupo compreende os conteúdos que formam as partes constitutivas da personalidade individual e, por isso mesmo, poderiam ser também de natureza consciente. O segundo grupo representa uma condição ou base da psique em geral, universalmente (coletivamente) presente e sempre idêntica a si mesma.

2.4.1 Inconsciente Psíquico Pessoal

Os conteúdos do inconsciente pessoal são aquisições da existência individual do “eu” que denominamos de “sombra” sendo a figura mais facilmente acessível à experiência, pois é possível ter um conhecimento bastante aprofundado de sua natureza. A “sombra” é o elemento inconsciente que mais freqüente e intensamente influencia ou perturba o “eu”. “Uma pesquisa mais acurada dos traços obscuros do caráter, isto é, das inferioridades do indivíduo que constituem a sombra, mostra-nos que esses traços possuem uma natureza emocional, certa autonomia e, consequentemente, são de tipos obsessivos, ou melhor, possessivos (Jung, 1986: 6)

A sombra é aquela personalidade oculta, recalcada, frequentemente inferior e carregada de culpas, cujas ramificações se estendem até o reino de nossos ancestrais animalescos englobando, deste modo, todo o aspecto histórico do inconsciente. Com a análise da sombra e dos processos nela contidos é possível fazer sair da casca. A sombra é a inferioridade do “eu” como uma “privatio boni” (ausência de bem). Um mundo tenebroso que oculta no seu interior fatores autônomos e influentes, em si indistinguíveis que foram repelidos pelo psiquismo consciente (Jung, 1986:254).

A sombra coloca obstinada resistência ao controle social e de modo geral, estas resistências ligam-se as projeções que não podem ser reconhecidas como tais e cujo conhecimento implica um esforço que ultrapassa os limites habituais do indivíduo. Os traços característicos da sombra podem ser reconhecidos através dos atos falhos ou sintomas, mas há pouca esperança de que o sujeito delas tome consciência (Jung, 1986:67).

A sombra representa o inconsciente pessoal, podendo por isso atingir a consciência sem dificuldades no que se refere a seus conteúdos, além de poder ser percebida e visualizada. A sombra se diferencia do “animus” e da “anima” que se acham bastante afastados da consciência, sendo este o motivo pelo qual dificilmente, ou nunca, eles podem ser percebidos em circunstâncias normais, no entanto, não é difícil, com certo grau de autocrítica, perceber a própria sombra, pois ela é de natureza pessoal (Jung: 1986:8).

Na realidade a sombra elabora um casulo que envolve o “eu” que somente com muita dificuldade o “eu” consegue desfazer, pois, a sombra é o lado obscuro da própria personalidade, muitas vezes inacessível ao “eu”.

2.4.2 Inconsciente Psíquico Coletivo

Os conteúdos do inconsciente coletivo são arquétipos que existem sempre e a priori. Sabemos que não é o sujeito que projeta, mas o inconsciente, não se cria a projeção, sendo que ela já existe de antemão. A conseqüência da projeção é um isolamento do sujeito em relação ao mundo exterior, pois em vez de uma relação real o que existe é uma relação ilusória. As projeções transformam o mundo externo em uma concepção irreal. Por isso, no fundo, as projeções levam a um estado de auto-erotismo ou autismo, em que se sonha com um mundo cuja realidade é inatingível (Jung, 1986:7). Quanto mais projeções se interpõem entre o sujeito e o mundo exterior, tanto mais difícil se torna para o “eu” perceber suas ilusões (Jung, 1986:8).

O inconsciente coletivo é o fator que trama as ilusões que encobrem o mundo e o próprio sujeito se expressando nas figuras da anima e do animus. Eles personificam os seus conteúdos, os quais podem ser integrados à consciência. Neste sentido, constituem funções que transmitem conteúdos do inconsciente para a consciência (Jung, 1986:18).

É de particular importância que não se pense no inconsciente coletivo como em imagens fantásticas que passam rápidas e fugidias, mas como fatores permanentes e autônomos, coisas que o são na realidade (Jung, 1986:18)

2.4.2.1 Anima

Lembra Jung (1986) que Anima é a mãe (astral) que ensina cuidadosamente a praticar as virtudes da fidelidade, da dedicação e da lealdade, a fim de preservar a pessoa do dilaceramento moral que está ligado à aventura da vida. Anima é caracterizada pela vaidade e sensibilidade e a pessoa aprende muito bem a lição, e permanece fiel à sua mãe astral e de muitas vezes de forma preocupante para ela quando se revela, por exemplo, seu caráter homossexual, em homenagem a ela, mas, ao mesmo tempo, também para sua satisfação inconsciente e mítica.

Anima é o arquétipo antiqüíssimo e sacrossanto do conúbio entre mãe e filho, é a mulher coroada de estrelas que o dragão persegue e as piedosas incertezas que envolvem as núpcias do Cordeiro. Anima é, simultaneamente, velha e jovem, Deméter e Perséfone e o filho é, ao mesmo tempo, esposo e criança adormecida de peito num estágio de indescritível plenitude, com a qual nem de longe se podem comparar as imperfeições da vida real, os esforços e as fadigas empregados no processo de adaptação, bem como o sofrimento causado pelas inúmeras decepções com a realidade (Jung, 1986:10)

A projeção Anima só pode ser desfeita para a pessoa quando o filho percebe que há uma imago da mãe no âmbito de sua psique, e não só uma imago da mãe, como também da filha, da irmã e da amada, da deusa celeste e da Baubo ctônica universalmente presente como imagem sem idade, e que toda mãe e toda amada é, ao mesmo tempo, a portadora e geradora desses reflexos profundamente inerentes à natureza do homem (Jung, 1986: 11)

O maior perigo da Anima é que ela exige o máximo do homem e quando há alguém capaz disto, ela efetivamente o recebe. Esta imagem é a “Senhora Alma”. Onde quer que se manifeste a Anima (nos sonhos, nas visões e fantasias) ela aparece personificada, mostrando deste modo que o fator subjacente a ela possui todas as qualidades características de um ser feminino. Não se trata de uma invenção da consciência; é uma produção espontânea do inconsciente (Jung, 1986:11).

2.4.2.2 Animus

Animus é o pai astral e possui tendência a argumentar. É nas discussões obstinadas em que mais se faz notar a sua presença. O que importa é o poder da verdade ou da justiça ou qualquer outra coisa abstrata sendo a soma das opiniões tradicionais desempenhando um grande papel na argumentação. Em inúmeros casos o animus se manifesta pela prática da crueldade quando a verdade e a justiça são rompidas (Jung:1986:13)

Animus sob a forma do pai expressa não somente opiniões tradicionais como também aquilo que se chama “espírito” e de certas concepções filosóficas e religiosas universais, ou seja, aquela atitude que resulta de tais convicções (Jung, 1986:14)

As projeções do animus são poderosas e enchem imediatamente a personalidade do sentimento inabalável de que ela está de posse da justiça e da verdade e em segundo lugar porque sua origem parece fundada consideravelmente em objetos e situações objetivas (Jung, 1986: 15). Jung (1986) pergunta: és capaz de conhecer teu pai? Sim. És capaz de conhecer este encoberto? Não. O encoberto é teu pai.

2.4.2.3 Anima e Animus

Não é difícil perceber o anima e animus, pois, temos a vantagem de certa preparação mediante a educação que sempre procurou convencer os homens de que eles não são feitos de ouro cem por cento puros, porr isso, qualquer um entende facilmente e sem demora o que os termos personalidade inferior e outros semelhantes significam, no entanto, podemos também dizer que o animus e a anima constituem parte de um domínio especial da natureza, que defende sua inviolabilidade com o máximo de obstinação, por isso é muito difícil conscientizar-se das projeções do par animus-anima, sendo necessário vencer muitas resistências para desvelar o casal astral (Jung, 1986: 15).

Nos seres humanos o animus lança mão da espada de seu poder e a anima asperge o veneno de suas ilusões e seduções (Jung, 1986:13). Da mesma forma que a anima se transforma em um Eros da consciência assim também o animus se transforma em um Logos; da mesma forma que a anima imprime uma relação e uma polaridade na consciência do homem, assim também o animus confere um caráter meditativo, uma capacidade de reflexão e conhecimento à consciência feminina (Jung, 1986:14).

Ressalta Jung (1986) que é muito difícil combinar intelecto e sentimento, pois os dois se repelem. Quem se identificar com um ponto de vista intelectual, poderá eventualmente confrontar-se com o sentimento sob a forma da anima, numa situação de hostilidade; inversamente, um animus intelectual brutalizará o ponto de vista do sentimento. No entanto, quem quiser realizar esta difícil tarefa, não só intelectualmente, mas também como valor de sentimento, deverá defrontar-se com o animus ou com a anima, a fim de alcançar uma união superior, uma unificação dos opostos. Este é um pré-requisito indispensável para se chegar à totalidade (Jung, 1986:29).

Eles são, no verdadeiro sentido da palavra, o pai e a mãe de todas as grandes complicações do destino e, como tais, são conhecidos no mundo inteiro desde épocas imemoriais: trata-se de par de deuses, um dos quais, por causa de sua natureza de Logos é caracterizado pelo Pneuma e pelo nous, como o Hermes de múltiplas facetas, enquanto a segunda é representada sob os traços de Afrodite, Helena, Perséfone e Hécate, por causa de sua natureza de Eros. Eles existem quer a consciência lhes reconheça o valor ou não, pois o seu poder aumenta de modo proporcional ao grau de inconsciência do “eu”. Quem não os percebe, fica ao seu sabor, como essas epidemias de tifo que se alastram quando não se conhece a sua fonte infecciosa. O que podemos descobrir inicialmente, a partir deles, é tão pouco claro que dificilmente alcança os limites da visibilidade. Só quando lançamos um jato de luz nas profundezas obscuras e exploramos psicologicamente os caminhos estranhamente submersos do destino humano é que podemos perceber, pouco a pouco, como é grande a influência desses dois complementos da consciência (Jung, 1986:19).

As figuras astrais de Anima e Animus constituem as bases arquetípicas das divindades masculinas e femininas, em todas as épocas e lugares, e, por este motivo, exigem uma atenção particular, sobretudo por parte dos psicólogos e, depois, de qualquer leigo dado à reflexão. Enquanto “númens”, o animus e a anima produzem ora o bem, ora o mal (Jung, 1986:256).

Nem todos os conteúdos da anima e do animus estão projetados. Muitos deles afloram nos sonhos e muitos outros podem alcançar a consciência mediante a chamada imaginação ativa. A Imaginação ativa são certas idéias, sentimentos e afetos fantásticos que ninguém antes de vivenciá-los considerava possíveis, mas estão vivos dentro de nós. Quem nunca teve uma experiência desta natureza consigo mesmo acha naturalmente que tal possibilidade é absolutamente fantástica, pois uma pessoa normal sabe muito bem o que pensa (Jung, 1986:17).

O politeísmo corresponde ao estágio animus-anima, ao passo que o monoteísmo corresponde ao Si-Mesmo (Jung, 1986:256).

Animus e anima existem a priori e partindo deste fato, é possível explicar a existência indiscutida e indiscutível, muitas vezes totalmente irracional, de certos caprichos e opiniões. A notória rigidez destas opiniões se explica, no fundo, pelo fato de que uma forte ação sugestiva origina do arquétipo fascinando o “eu” e o mantendo hipnoticamente prisioneiro. Muitas vezes o “eu”, nessas circunstâncias, tem uma ligeira sensação de haver sofrido uma derrota moral e se comporta de maneira ainda mais renitente, orgulhosa e obstinada em suas posições, aumentando seu sentimento de inferioridade, num círculo vicioso. Com isto ele priva a relação humana de uma base sólida, pois não só a megalomania como também o sentimento de inferioridade impossibilitam qualquer reconhecimento mútuo sem o qual não há relacionamento algum (Jung, 1986:15).

O homem é compensado pelo feminino, assim também a mulher o é pelo masculino, assim como a mãe parece ser o primeiro receptáculo do fator determinante de projeções relativamente ao filho, assim também o é o pai em relação a filha. A mulher é compensada por uma natureza masculina, e por isso o seu inconsciente tem, por assim dizer, um sinal masculino. O fator determinante de projeções presentes na mulher é o animus e no homem a projeção determinante é a anima. No homem a função anima, via de regra aparece menos desenvolvido do que o Logos e na mulher a função animus aparece menos desenvolvido que o Eros, o Eros é expressão de sua natureza real, enquanto que o Logos muitas vezes constitui um incidente deplorável (Jung, 1986:12).

3 Projeção

A sombra, o animus e a anima atuam através de projeções e o fator formador de projeção é de uma realidade impossível de ser negada.

Quem, entretanto nega este fator, identifica-se com ele, e isto não é apenas inquietante, mas simplesmente perigoso para o bem-estar do indivíduo. Não se tem diretamente consciência deste estado de projeção, pelo contrário, sua existência somente pode ser detectada, na melhor das hipóteses, a partir de sintomas indiretos (Jung, 1986: 22).

Jung realça (1986) que a projeção da sombra, animus e anima aumentam quanto maior for o nosso ponto cego. Quanto maior for a nossa inconsciência a esse respeito mais nos identificamos com estas figuras astrais.

Psicologicamente consideramos que os impulsos da sombra, animus e anima são certas forças naturais que se manifestam em nós, sob a forma de impulsos ou, como sendo a vontade de Deus. Com isso nos pomos em consonância com as figuras astrais que influenciam a vida psíquica, assim passamos a funcionar como tem funcionado o ser humano em todos os lugares e em todas as épocas. A existência dos habitus coletivos guiados pelas figuras astrais nos mostra hipoteticamente a capacidade de sobrevivência no ambiente que estamos inseridos e enquanto estivermos em consonância com eles, existe para nós uma possibilidade racional de sobreviver, pois, não levamos em consideração outras possibilidades (Jung, 1986: 25).

Quando reprimimos as figuras astrais elas voltam a se manifestarem em outro lugar e sob uma forma modificada, mas desta vez carregado de um ressentimento que transforma o impulso natural, em si inofensivo, em nosso inimigo. Podemos dizer que estas figuras são os grandes demônios. O vocábulo grego demônio exprime um poder determinante que vem ao encontro do homem, de fora. (Jung, 1986: 40).

4 A Libertação

Quem não sabe libertar a verdade “veritas” presente no interior da alma das cadeias em que está presa, também não conseguirá a sua libertação. Somente é capaz de fabricar o ouro quem possui a doutrina correta e a doutrina correta é a sua própria transformação, somente se transforma se transformando. Com base nestas considerações o autoconhecimento é de fundamental importância. A esperança para se livrar dos demônios astrais está depositada no próprio “eu” (Jung, 1986: 153).

O conhecimento do mundo reside dentro do próprio peito e o adepto deve extrair o conhecimento a respeito do mundo no seu próprio interior, pois o “eu” deve se conhecer em primeiro lugar. Quando o “eu” se conhece, conhece também o Si-Mesmo. O Si-Mesmo é o arcanum, a pedra preciosa que está no interior do “eu” quie ele ainda ignora, mas que tomará consciência na sua busca para se livrar dos demônios astrais. Quem procura seriamente reconhecer-se o seu próprio “eu” torna-se suspeito de egoismo e de extravagância (Jung, 1986: 154).

O Mestre somente pode transmitir ao discipula a teoria, ou seja, a teoria representa o único bem verdadeiro que o adepto pode tomar como ponto de partida. A primeira coisa que ele deve encontrar é a prima matéria ou seja, o segredo dos sábios, a teoria transmissível pelo Mestre. A teoria ou doutrina expressa pelo Mestre é a experiência interior do próprio Mestre que ele transmite ao buscador da verdade (Jung, 1986:133).

5 Deus

A imagem divina do homem e o Si-Mesmo foram danificadas pelo pecado, mas, pode ser restaurada (reformada) com a ajuda de Deus, de acordo com o que a Carta aos Romanos 12:2. “E não vos conformeis com os esquemas deste mundo, mas transformai-vos pela renovação da vossa mente, para que possa discernir qual é a vontade de Deus” (Jung, 1986:37).

A imagem divina não é uma invenção qualquer, mas uma experiência que ocorre espontaneamente no “eu”, por isso, a imagem de Deus (de início inconsciente) tem condições de modificar o estado de consciência introduzindo as correções na imagem (consciente) de Deus (Jung, 1986:185).

Jung (1986) relembra que não é difícil o “eu” ter uma percepção inicial de Deus compreendendo os enunciados universais acerca de Deus que está em nós e acima de nós, de Cristo e do seu corpo místico e, da alma suprapessoal. A questão é tão óbvia que o intelecto humano se apodera com facilidade dessa compreensão do “eu” a respeito de Deus e disto nasce a ilusão de que assim tomamos posse do objeto. Quando compreendemos intelectualmente caímos na ilusão que estamos vivenciando Deus, mas na realidade nada se conseguiu, a não ser um saber intelectual a respeito do Si-Mesmo. Desde épocas antigas as pessoas confundem o saber com a vivência em Deus, a idéia concebida com o próprio objeto, bastando saber, ou pronunciar o nome para tornar presente o objeto. Na realidade, a razão teve razões de sobra para reconhecer, ao longo dos séculos, a futilidade dessa opinião; mas isto não impediu que, ainda em nossos dias, o mero domínio intelectual seja considerado como absolutamente válido.

A psicologia experimental nos mostra claramente que o ato de conceber, mediante o intelecto, um fato psicológico produz apenas um conceito e o conceito não passa de um nome, de um mero sopro da voz, não tendo substância inerente. São sonoras, mas não encerram valor algum sem nenhuma realidade. O intelecto é de incontestável utilidade, mas, além disto, é também um grande embusteiro e ilusionista, sempre que tenta manusear valores. (30)

Devemos saber que apenas quando somos afetados por Deus é que inicia o processo de conscientização, alcança então Ele alcança a consciência. Somente quando o “eu” é afetado é que fica envolvido e sente a nova realidade. O ser afetado é uma nova realidade que provoca modificações nos pensamentos e ações. Para melhor entendimento podemos dizer que existe uma grande diferença em saber a descrição de uma enfermidade e estar enfermo, vivenciando a enfermidade. Uma percepção meramente intelectual pouco significa, pois o que se conhece são palavras e não a substância a partir de dentro. O “eu” tem que ser afetado pelo processo, é inerente a todo processo psíquico a qualidade de valor, isto é, a tonalidade afetiva (Jung, 1986:31).

Da mesma maneira que temos que ser afetado pelo Si-Mesmo somente podemos ter uma idéia satisfatória da sombra, do animus e anima a partir de uma experiência viva. Somente podem ser elucidadas à base da experiência (Jung,1986: 31).

6 Simbologia

O ato do “eu” ser afetado pelo Si-Mesmo provoca uma relação intrínseca com a consciência que materializa em símbolos ou mitos a relação de afetividade. Da mesma maneira que o vinho novo não deve ser colocado em odres velhos, da mesma forma que a serpente troca de pele, assim também o mito e símbolos precisam de nova roupagem em cada éon, para não perder a sua força terapêutica (Jung, 1986: 171). A tendência moderna à destruição e perda de consciência de toda tradição simbólica e dos mitos interrompe o processo normal de evolução durante vários séculos, e constituir um intervalo de barbárie. O desenraizamente e a ruptura com a tradição mística neurotizam as massas e as preparam para a histeria coletiva sendo necessário a terapia coletiva, que consiste na privação da liberdade e na implantação do terror. Por isso, onde impera o materialismo racionalista predominam as prisões e asilos de loucos (Jung, 1986:171).

O monte sempre significou ascensão, e particularmente ascensão mística (espiritual) até o cume, isto é, até a proximidade do Espírito e ao lugar da Revelação (Jung, 1986:194). O peixe simboliza o “eu” que surge das profundezas do inconsciente, o filho de Deus (Jung, 1986:173)

A serpente e o dragão correspondem ao “eu” totalmente inconsciente e incapaz de atingir o Si-Mesmo vivendo nas emanações do inconsciente pessoal e coletivo, não tendo sabedoria própria. Não possuem um conhecimento considerado como sendo de caráter sobrenatural. Sua falta de relação, sua frieza e periculosidade expressam o mundo dos instintos causando um efeito terrível tal como acontece com a súbita aparição de uma serpente venenosa. A serpente é o símbolo mais freqüente do mundo obscuro dos impulsos (Jung, 1986: 223).


7 Objetivos do Ser Humano

O “eu” deve buscar conhecer apenas o Si-Mesmo como se não tivesse outra coisa a fazer, deixando Deus realizar nele o que lhe aprouver. Que o homem seja apenas o que era quando veio de Deus. Neste uno devemos mergulhar por toda a eternidade, do nada para o nada. Assim Deus nos ajude. Amem (Jung, 1986:184).

Do centro do homem completo flui o Oceano (no qual Deus se encontra). Deus é a verdadeira porta pela qual o homem completo deve passar, a fim de renascer (Jung, 1986:202). O morto ressuscitará, ao atravessar a porta dos céus (Jung, 1986:205).

Sempre que um “eu” se conhece, sabe que seu movimento natural não se processa em linha reta, pois sofreu um desvio; mas sabe que descreve um movimento circular em torno de seu princípio interior, em torno de um centro que é o Si-Mesmo (Deus). O “eu” movimenta-se em torno de seu centro, isto é, em torno do princípio de onde ela procede. O “eu” se mantém preso a Ele, movimenta-se em direção a Ele, como deveriam fazer todos os “eus”. Mas só os “eus” dos deuses se movimentam em direção a Ele, e por isso são deuses, pois tudo o que se acha unido a esse centro é, em verdade, deus, ao passo que o que se acha afastado dele é o homem, o homem sem unidade, o homem animal (Jung, 1986:209).

Observa Jung (1986) que é muito árduo descobrir o “eu” e difícil entendê-lo, e que também é difícil chegar ao conhecimento do homem “completo”, mas, o começo da perfeição é o conhecimento do “eu”, ao passo que o conhecimento de Deus é a perfeição acabada. A maior de todas as doutrinas consiste em conhecer-se a si mesmo. De fato, quando o homem se conhecer a si mesmo, conhecerá também a Deus. Procure-o dentro de ti mesmo e aprende quem é Aquele que diz: “Meu Deus, meu Deus, meu entendimento, minha alma, meu corpo.” O portal, a passagem para Deus é dentro de ti mesmo (Jung, 1986:212).

REFERÊNCIA

JUNG, Carl Gustav. Aion estudos sobre o simbolismo do si-mesmo. Petrópolis: Vozes, 1986.



Teoria Psicanalítica de Wilhelm Reich

Marcos Spagnuolo Souza



1 Biografia

Nasceu em 24 de março de 1896 em uma pequena aldeia no noroeste da Ucrânia em uma família abastada de proprietários judeus.

Desde cedo, vivendo na fazenda e em contacto directo com a natureza, se interessou pelos fenómenos e funções naturais. Na sua autobiografia de juventude conta que aos quatro anos já sabia o essencial sobre a sexualidade animal e humana. Aos onze anos e meio teve a sua primeira cópula, com a cozinheira da casa, que lhe ensinou os movimentos de vaivém do coito. A partir de então, diz ele, teve relações sexuais quase diárias durante anos.

No ano de 1909 a sua mãe, devido as frequentes viagens e ausências do marido, foi seduzida pelo preceptor dos filhos. À noite, o jovem Wilhelm espiava os amantes, chegando mesmo a sentir desejo pela própria mãe. No início de 1910 o seu pai descobriu a traição de sua mãe com o testemunho de Reich. O pai de Reich passou a atormentar e a humilhar impiedosa e diariamente a sua mulher, de tal forma que ela acabou por se suicidar no dia 29 de setembro de 1919.

Em 1918, com o final da guerra, ansioso de aprender rapidamente uma profissão que lhe permitisse subsistir, ingressou no curso de Direito, o mais breve de todos, mas depressa se aborreceu e logo se transferiu para a Faculdade de Medicina. Sobrevivia fazendo trabalhos para os seus colegas. Formou em 1922 e inicia seus trabalhos com o tratamento de pacientes com distúrbios mentais, na Universidade Neurológica e Psiquiátrica, junto a Paul Schilder. Em 1924, faz sua pós-graduação, sendo membro integrante da sociedade psicanalítica de Viena, até 1930. Foi um discipulo dissidente de Sigmund Freud.

Foi casado com a sua paciente Annie Reich (que se tornaria psicanalista), de quem se divorciou em 1932, e de quem teve duas filhas. Viveu mais tarde com a bailarina Elsa Lindenberg, de quem se separaria ao partir para os Estados Unidos da América. Casou com sua assistente com quem teve um filho e mais tarde divorcia-se passando a ter ligações com a bióloga e sua colaboradora, Aurora Karrer, sua última companheira.

Nos Estados Unidos cria um instituto para o estudo do "orgone universal", que utiliza nos tratamentos de cancer. Em 1954 passa a ser investigado pela (Federal Food and Drug Administration), que lhe rende um processo e posterior aprisionamento. Encarcerado no dia 12 de março de 1957, morre de ataque cardíaco em 3 de novembro.

Onde quer que fosse, Reich era tratado como louco, e suas idéias como pura mistificação. Alguns de seus seguidores atribuem a prisão, bem como as anteriores perseguições, a uma eventual conspiração da sociedade freudiana.

2 Teorização

Self: núcleo saudável de cada indivíduo. A maioria das pessoas não está em contato com o Self por causa da couraça física e das defesas psicológicas.

Caráter é composto das atitudes habituais de uma pessoa e de seu padrão consistente de respostas para várias situações. Inclui atitudes e valores conscientes, estilo de comportamento (timidez, agressividade e assim por diante) e atitudes físicas (postura, hábitos de manutenção e movimentação do corpo).

O caráter se forma como uma defesa contra a ansiedade criada pelos intensos sentimentos sexuais da criança e o conseqüente medo da punição. A defesa contra o medo faz surgir nas pessoas o caráter.

As defesas da pessoa se tornam cronicamente ativas e automáticas e evoluem para traçar o caráter.

O caráter inclui a soma total de todas as forças defensivas repressoras organizadas de forma mais ou menos coerente. As defesas de caráter são particularmente efetivas e, além disso, difíceis de erradicarem pelo fato de serem bem racionalizadas pelo indivíduo e experimentadas como parte de seu próprio conceito de vida.



Cada atitude de caráter tem uma atitude física correspondente. O caráter do indivíduo é expresso corporalmente sob a forma de rigidez muscular ou couraça muscular.

A couraça física e a psicológica são essencialmente a mesma coisa.

O caráter impede a plena manifestação do self. O self somente se manifesta quando a couraça é dissolvida e torna-se plenamente consciente do corpo. Enquanto há a presença de bloqueios, o fluxo de energia e a consciência são restritos, e a autopercepção é bastante diminuída e distorcida.

O caráter resiste à análise.

Crescimento é o processo de dissolução da nossa couraça psicológica e física, tornando-nos, gradualmente, seres humanos mais livres, abertos e capazes de gozar um orgasmo pleno e satisfatório.

A meta da terapia deveria ser a libertação dos bloqueios do corpo e a obtenção de plena capacidade para o orgasmo sexual, o qual está bloqueado na maioria dos homens e das mulheres.

Tratar os pacientes pela interpretação da natureza e função de seu caráter, ao invés de analisar seus sintomas.

3 Energia Orgônica:

Livre de massa; não tem inércia nem peso.

Está presente em qualquer parte, inclusive no vácuo.

É sempre ativa, estando sempre em movimento.

Altas concentrações de energia orgônica atraem a energia orgônica de ambientes menos concentrados.

A energia orgônica é responsável pelo todo processo de transformação e criação.

Energia orgônica flui naturalmente por todo o corpo, de cima a baixo, paralela à espinha.

As couraças são nódulos onde a energia orgônica está bloqueada.

A couraça restringe o livre fluxo de energia como a livre expressão de emoções do indivíduo.

Terapia consiste em dissolver cada segmento da couraça, começando pelos olhos e terminando na pelves. Cada segmento é uma unidade mais ou menos independente com a qual se precisa lidar separadamente.

4 Couraças Somáticas

Olhos: a couraça dos olhos é expressa por uma expressão "vazia" dos olhos, que nos vêem por detrás de uma rígida máscara. Quem nos olha não é o “eu” e sim a máscara. A couraça é dissolvida fazendo-se com que os pacientes abram bem seus olhos, como se estivessem com medo, encorajando o movimento livre dos olhos, fazer movimentos circulares com os olhos e olhar de lado a lado.

Boca: inclui os músculos do queixo, garganta e a parte de trás da cabeça. A pessoa não consegue chorar, rir, gritar, fazer caretas e sugar. A couraça pode ser solta encorajando-se o paciente a chorar, a produzir sons que mobilizem os lábios, a morder e a vomitar e trabalhando diretamente com massagens com os músculos envolvidos.

Pescoço: inclui os músculos profundos do pescoço e a língua. A pessoa não fala, não demonstra raiva e não chora. Tratamento: gritar, berrar e vomitar são os meios importantes para soltar este segmento.

Tórax: músculos longos do tórax, os músculos dos ombros e da omoplata, toda a caixa torácica, as mãos e os braços. O paciente não demonstra alegria e nem tristeza, não possui desejos e sente falta de ar. A couraça pode ser solta através do trabalho com respiração, especialmente o desenvolvimento da expiração completa. Bater os braços, bater palma, rasgar objetos, triturar objetos e procurar soltar todos os desejos sufocados.

Diafragma: diafragma, estômago, plexo solar, vários órgãos internos e músculos ao longo das vértebras torácicas baixas. Paciente com curvatura da espinha para frente, de modo que há um espaço considerável entre a parte de baixo das costas do paciente e o colchão. Sente dificuldade de expirar. Raiva extremada incubada. Trabalhar repetidamente a expiração e inspiração.

Abdômen: inclui os músculos abdominais longos e os músculos das costas que estão rígidos. Inibição do rancor. Expressões corporais com total liberdade. A

Pelve: os músculos da pelve e membros inferiores. Quanto mais intensa a couraça, mais a pelve é puxada para trás. Os músculos são tesos e doloridos, e a pessoa não possui desejo sexual. Inibição das ansiedades, raiva e o prazer. Ansiedade e a raiva resultam das inibições das sensações de prazer sexual. Trabalhar a sexualidade da pessoa.

5 Atividades Compatíveis Para Encouraçados

Mecanicismo: os mecanicistas são tão bem encouraçados que não têm idéia real de seus próprios processos de vida ou de sua natureza interna. Eles têm um medo básico de emoções profundas, vivacidade e espontaneidade. Eles tendem a desenvolver um conceito rígido e mecânico da natureza e estão primariamente interessados nos objetos externos e nas ciências naturais. Comentando sua idéia, achava que pelo fato de uma máquina ter que ser perfeita, por conseguinte, o pensamento e as ações do homem da ciência também teriam que ser perfeitos. Perfeccionismo é uma característica essencial do pensamento mecanicista. Ele não tolera erros e incertezas, e as situações de mudança são inoportunas. Mas este princípio, quando aplicado a processos da natureza, inevitavelmente conduz à confusão, pois a natureza não opera mecanicamente, mas funcionalmente.

Misticismo Maniqueísta: ascetas e anti-sexuais rejeitando sua própria natureza física e buscando a perda do contato com o corpo.

6 A Função do Orgasmo

A meta da terapia deveria ser a libertação dos bloqueios do corpo e a obtenção de plena capacidade para o orgasmo sexual, o qual sentia estar bloqueado na maioria dos homens e das mulheres.

Existência de uma substância energética que ele denominou de orgônio cósmico ou fluido cósmico universal e que os efeitos da respiração no ato sexual sobre o indivíduo faria o orgônio circular harmonizando todo o aspecto somático.

7 Técnicas para dissolver a couraça:

Armazenamento de energia no corpo por meio de respiração profunda;

Oferecer condições ao paciente para liberar todas as suas emoções encouraçadas.

Trabalhar no relaxamento da couraça muscular atacando diretamente os músculos cronicamente tensos por meio de massagens localizadas a fim de soltá-los. Trabalhar diretamente com as mãos sobre os músculos tensos a fim de soltar ás emoções presos a eles.

Desenvolver uma livre expressão de sentimentos sexuais e emocionais dentro do relacionamento. Levar as pessoas a vivenciarem com plenitude o orgasmo, o clímax da atividade sexual. Entrega total à experiência sexual em oposição aos movimentos forçados ou até violentos dos indivíduos encouraçados.

Libertação de emoções (prazer, raiva, ansiedade) através do trabalho com o corpo.

Analisar em detalhes a postura de seus pacientes e seus hábitos físicos mostrando que os bloqueios aos sentimentos vitais provocam perturbações em diferentes partes do corpo.

Tornar os pacientes mais conscientes de seus traços de caráter imitando com freqüência suas características, gestos ou posturas, ou fazer com que os pacientes repitam ou exagerem as suas facetas habituais de comportamento, por exemplo: um sorriso nervoso.

Trabalhar a autoregulação dando espaço para que o paciente possa refletir livremente a energia que movimento o seu corpo. Agir em termos de suas próprias inclinações e sentimentos internos, ao invés de seguirem algum código externo ou ordens pré-estabelecidas por outros.

8 Obstáculos ao Crescimento Couraça

Desenvolver plena atividade sexual.

Identificar com a natureza e com tudo que o rodeia, assim passa a sentir vivo novamente antes de ser esmagado pela educação.

Deixar o trabalho que é executado de forma mecânica e procurar um emprego que preenche suas necessidades e desejos interiores.

Expressar suas emoções biológicas primitivas, vivenciar o prazer da vida, berrar quando tem vontade e chorar também quando possui vontade. Exprimir suas emoções de agrado.



9 O Terapeuta

Terapeuta: é uma pessoa sem couraça para poder trabalhar a clinica. O terapeuta deve ter superado todos os medos de sons sexuais abertamente emitidos e do "ondular orgástico". Nenhum terapeuta deve tentar tratar pacientes que tenham problemas que ele não foi capaz de solucionar em si mesmo, e nem deveria esperar que um paciente faça coisas que ele não pode fazer e que não foi capaz de fazer.

O pré-requisito indispensável em qualquer método usado pelo terapeuta para libertar as emoções contidas na musculatura é que ele esteja em contato com suas próprias sensações e que seja capaz de empatizar completamente com o paciente e de sentir em seu próprio corpo o efeito das constrições particulares da energia do paciente.

10 Comentários Dispersos



Indivíduos criados numa atmosfera que nega a vida e o sexo desenvolvem um medo do prazer, o qual é representado por sua Couraça Muscular. Essa Couraça do Caráter é à base do isolamento, da indigência, do desejo de autoridade, do medo da responsabilidade, do anseio místico, da miséria sexual e da revolta neurótica, assim como de uma condescendência patológica.

Repressão Social e Cultural dos Instintos: esta é a maior fonte de neuroses e ocorrem durante a primeira infância, puberdade e idade adulta. Os bebês e as crianças pequenas são confrontados com uma atmosfera familiar neurótica, autoritária e repressora do ponto de vista sexual. Durante a puberdade, os jovens são impedidos de atingir uma vida sexual real e a masturbação é proibida. Na idade adulta, a maioria das pessoas se vê envolvida na armadilha de um casamento compulsivo, para o qual estão sexualmente despreparadas.

Não podemos separar intelecto, emoção e corpo. O intelecto possui uma carga afetiva tão forte quanto qualquer emoção. O desenvolvimento completo do intelecto requer o desenvolvimento de uma verdadeira genitalidade, no entanto, a primazia do intelecto pressupõe uma disciplinada economia de libido (desejo sexual).

Tudo o que você precisa fazer é continuar o que tem feito: lavrar seu campo, manejar seu martelo, examinar seus pacientes, levar suas crianças à escola ou ao parque de diversões, falar sobre os fatos do dia, penetrar sempre mais profundamente nos segredos da natureza. Todas essas coisas você já faz. Mas você pensa que nenhuma delas tem importância. Tudo o que você tem a fazer é continuar o que você sempre fez e sempre quis fazer.

A vida distorcida por indivíduos encouraçados acarreta o desastre final a toda a humanidade e das suas instituições.

Referências

ALBERTINE, Paulo. Reich: história das idéias e formulações para a educação. São Paulo: Ágora, 1994.

BOADELLA, David. Nos caminhos de Reich, São Paulo: Summus, 1985

REICH, Ilse. Wilhelm Reich: una biografia personal. Buenos Aires: Granica, 1972.

RECH, Wihelm. Paixão e Juventude: uma autobiografia. São Paulo: Brasiliense, 1996.

A Teoria Psicanalítica de Carl Gustav Jung

Marcos Spagnuolo Souza

1 Biografia

Carl Gustav Jung nasceu no dia 26 de julho de 1875. Ao longo de sua vida Jung experimentou sonhos periódicos e visões com notáveis características mitológicas e religiosas, os quais despertaram o interesse por mitos, sonhos e a psicologia da religião. Ao lado destas experiências, certos fenômenos parapsicológicos emergiam, sempre para lhe redobrar o espanto e o questionamento.

Por muitos anos Jung sentiu possuir duas personalidades separadas: um ego público, exterior, que era envolvido com o mundo familiar, e um eu interno, secreto, que tinha uma proximidade especial para com Deus. Ele reconhecia ter herdado isso de sua mãe, que tinha a notável capacidade de "ver homens e coisas tais como são".

Ao longo da sua juventude interessou-se por filosofia e por literatura. Quando estudava medicina dedica-se a psiquiatria. Em 1900 tornou-se interno na Clínica Psiquiátrica Burgholzli, em Zurique.

Jung viu em Freud um companheiro para desbravar os caminhos da mente. Enviou-lhe copias de seus trabalhos sobre a existência do inconsciente, confirmando concepções freudianas de recalque e repressão. Ambos encantaram-se um com o outro, principalmente porque os dois desenvolviam trabalhos inéditos em medicina e psiquiatria.

Porém, tamanha identidade de pensamentos e amizade não conseguia esconder algumas diferenças fundamentais. Jung jamais conseguiu aceitar a insistência de Freud de que as causas dos conflitos psíquicos sempre envolveriam algum trauma de natureza sexual, e Freud não admitia o interesse de Jung pelos fenômenos espirituais como fontes válidas de estudo em si. O rompimento entre eles foi inevitável.

As autoridades nazistas na Alemanha determinaram que todas as obras de Jung fosse interditada e queimada.

Carl Gustav Jung morreu no dia 6 de junho de 1961, aos 86 anos, em sua casa, nas margens do lago de Zurique, após uma longa vida produtiva, que marcou a Antropologia, Sociologia e a Psicologia.

2 O Sonho

Jung sonhou com uma casa, que ele sabia ser sua casa,embora fosse diferente da sua moradia real. Segundo sua interpretação posterior, a casa era um símbolo dele mesmo, com seus diferentes níveis de consciência. No andar mais alto havia uma sala bem mobiliada com móveis de estilo rococó. Para Jung, isso era uma representação de seu nível consciente. Descendo as escadas, viu outro andar, na penumbra, com móveis mais antigos em um andar representando a época medieval o que ele interpretou como sendo o começo de seu inconsciente. Descendo outro lance de escadas, encontrou um porão, com paredes características da época romana, que ele considerou um nível ainda mais profundo do inconsciente. No piso empoeirado, viu um alçapão que o conduziu a uma gruta, onde encontrou ossadas, vasos de cerâmica e vestígios de uma civilização primitiva. Ali, Jung finalmente descobriu dois crânios, meio desintegrados, que fariam parte do último extrato de consciência, representando camadas muito antigas. Depois disso, acordou.

Quando contou o sonho da casa a Freud, este o interpretou segundo suas teorias, focalizando nos crânios, que, para o velho mestre, poderiam significar desejos secretos de morte. Jung discordou. Ele estava mais interessado no conjunto integral das imagens do sonho. E, a partir dele, concluiu que o inconsciente seria mais que um depositário de desejos reprimidos expressos em sonhos, como acreditava Freud. Embora não negasse a existência do inconsciente individual, Jung acreditava em um inconsciente maior, mais profundo, não pessoal, comum a todos os homens e culturas (era o que sugeriam os vários andares, com representações de várias fases históricas da cultura ocidental). A isso ele chamou de inconsciente coletivo.

Segundo Jung, esse inconsciente se exprime por meio de símbolos, que vêm à tona em sonhos, mitos e expressões artísticas. Todos os seres humanos, de qualquer povo, diz ele, compartilham os mesmos símbolos, mas em cada cultura eles têm roupagens próprias. A essas fôrmas comuns ele deu o nome de arquétipos.

3 Cobaia de Si Mesmo

Assim, para ter acesso total ao resultado da aplicação de suas teorias, decidiu experimentá-las em si mesmo. Foi o que fez. Durante cinco anos, enquanto levava sua vida normal como pai de família e diretor do Hospital Psiquiátrico de Bugholzli, em Zurique, anotou seus sonhos e insights. E em 1913 resolveu mergulhar no próprio inconsciente, uma viagem que ele realizou como se entrasse em um sonho, quase hipnoticamente. É bom dizer que o médico sempre teve esse tipo de visões, mas dessa vez, em vez de afugentá-las, partiu em sua direção.

"Foi no ano de 1913 que decidi tentar o passo decisivo - no dia 12 de dezembro. Sentado em meu escritório, considerei mais uma vez os temores que sentia e depois me abandonei à queda. O solo pareceu ceder sob meus pés e fui como que precipitado numa profundidade obscura. Não pude evitar um sentimento de pânico, mas, de repente, sem que ainda tivesse atingido uma grande profundidade, encontrei-me, com grande alívio - de pé, numa massa mole e viscosa. A escuridão era quase total", descreveu. No local em que estava Jung teve inúmeras visões, que posteriormente ele interpretou como arquétipos. O importante é que, no fundo desse local escuro, ele viu o brilho intenso de um sol vermelho nascendo. Para ele, significava que no inconsciente mais profundo havia algo muito bom, uma salvação. E Jung dedicaria sua vida para procurá-la.

4 Teorização

Jung concordava que, quando um paciente entendia racionalmente o motivo pelo qual um símbolo aparecia em seus sonhos esse símbolo perdia seu poder perturbador. Se um paciente, por exemplo, tivesse um sonho recorrente com uma bruxa que o perseguia, Jung começaria perguntando se a emoção provocada pela bruxa lembrava algum episódio da vida real (por exemplo, um repreensão severa sofrida na escola). Depois, paciente e psicólogo investigariam esse incidente, tentando entender por que o episódio perturbava (digamos que, na lembrança do paciente, a professora fosse muito cruel ou brava). Pronto. Jung acreditava que, revelado à luz da razão, o símbolo perdia seu poder. Se aquele episódio fosse de fato à causa da imagem da bruxa, ela em breve desapareceria dos sonhos.

Para Freud, a força por trás dos sonhos eram sempre desejos reprimidos, principalmente sexuais. Para Jung, não. Ele acreditava que os símbolos podiam expressar um desejo interno de compreensão - isto é, apareciam em sonho justamente para serem entendidos.

Jung dizia que, se não fossem manifestados conscientemente, poderiam lançar "sombras" em outras pessoas ou situações. Ainda no exemplo da bruxa, essa imagem poderia dificultar, inconscientemente, o relacionamento do paciente com mulheres mais velhas (mãe, chefes), que poderiam ser consideradas ameaçadoras. Ou seja, essas projeções turvavam a visão da realidade. Com o tempo, o indivíduo poderia desenvolver uma neurose, isto é, um desvio do entendimento do que é real. A neurose acreditava Jung, tinha uma vantagem: ela pressionava para que o problema fosse resolvido.

Segundo Jung o inconsciente enviava símbolos à tona para que a mente consciente fosse, aos poucos, compreendendo e integrando todo seu conteúdo submerso. Era uma atividade natural da psique, pensava Jung. Era assim que a personalidade total do indivíduo se desenvolvia e amadurecia: integrando os símbolos do inconsciente na consciência.

Com esse aumento de compreensão, automaticamente a consciência se ampliava. Esse processo ele chamou de individuação, que era acelerado pela análise dos sonhos e dos símbolos neles contidos. No processo de ampliação da consciência do eu, que é o desvelamento do inconsciente pessoal e coletivo torna-se possível iniciar o processo de conscientização do Si-Mesmo que é uma unidade psíquica maior e mais importante que o “eu”.

Imagine um galpão infinito às escuras, à exceção de um círculo iluminado por uma única lâmpada que é o “eu”. Segundo Jung, o Si-Mesmo é o galpão, o único que sabe tudo o que existe lá dentro. No galpão está o “eu” com a sua estrutura composta pelo somático e psique. O objetivo da estrutura do “eu” é desvelar o Si-Mesmo. A partir do momento em que o “eu” inicia o processo de conscientização do Si-Mesmo passa a sentir paz, tranquilidade e totalidade integrando-se com o Universo visível e invisível.

Referências

AKOUN, André. Carl Gustav Jung. Em: Psicologia Moderna, Vol. 4: Os 10 Grandes do Inconscientes. Lisboa/S. Paulo: Verbo, 1979.

CABRAL, Álvaro; OLIVEIRA, Eduardo Pinto de. Uma Breve História da Psicologia. Rio de Janeiro: Zahar, 1972.

DURANT, Will. A História da Filosofia. (Os Pensadores). Rio de Janeiro: Nova Cultural, 1996.

EVANS, Richard Isadore. Construtores da Psicologia. (Entrevista com C. G. Jung, pp. 326-338). São Paulo: Summus: Ed. Da Universidade de São Paulo, 1979.

GAY, Peter. Freud: Uma Vida Para o Nosso Tempo. São Paulo: Companhia das Letras, 1989.

JUNG, Carl Gustav. O Homem e seus Símbolos. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1977.

SILVEIRA, Nise da. Jung: Vida e Obra. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1978.



Teoria Psicanalítica de Alfred Adler

Marcos Spagnuolo Souza

1 Biografia

Filho de judeus húngaros, nasceu em 1870, formou-se em medicina, psicologia e filosofia pela Universidade de viena. Praticou clínica geral antes de se dedicar à psiquiatria. Em 1902 foi trabalhar com Sigmund Freud, realizando pesquisas no campo da psicanálise. Mais tarde, desliga-se dele por considerar o fator sexual superestimado por Freud.

Morreu quando se encontrava em Aberdeen, Escócia, ministrando um curso de psicologia. Merece lugar de destaque no movimento psicanalítico pela importância que deu ao fator da agressividade.

Adler e Jung foram considerados como dissidentes, renunciaram ou foram expulsos da Sociedade Psicanalítica e formaram dois movimentos dissidentes por eles dirigidos, um em Zurique e outro em Viena. Adler baseando as explicações dos mecanismos de inferioridade e da ânsia do poder deu o seu movimento de Psicologia Individual e Jung adotou o nome de Psicologia Analítica ou Complexa.

Não se pode falar em uma Psicanálise tipicamente freudiana, mas de um movimento psicanalítico poliforme e diversificado.

Alfred Adler introduziu conceitos: "sentimento de inferioridade" ou, mais popularmente, "complexo de inferioridade".

2 Teoria de Base

Em contraste com a psicanálise de Freud a psicologia individual fez a ênfase na importância da vontade consciente e da capacidade dos cada indivíduo para se encarregar de seu próprio destino.

Não postula forças intangíveis profundas na psique e compreende o comportamento em termos de contexto (ambiente físico e social), onde o indivíduo está integrado ao social. O indivíduo como uma entidade unificada e coerente, a vida humana como sendo uma luta dinâmica pela perfeição. O indivíduo sendo uma entidade criativa e autodeterminada.

O poder está dentro de cada um de nós para enfrentar as forças externas. É justamente esta luta com o mundo externo é que molda a nossa personalidade. Não somos instrumentos do destino e não podemos assumir o papel de vítima diante do jogo da vida.

O que determina o nosso comportamento não é o mundo real, mas a nossa concepção do mundo. Os seres humanos moldam as suas próprias personalidades e não se limitam a ser impotentes e governados por forças externas.

A opinião do indivíduo sobre si próprio e sobre o mundo influencia todo o seu processo psicológico. Porque todos os problemas importantes da sua vida são problemas de natureza social, eles precisam ser vistos em seu contexto social.

A estrutura da personalidade de cada indivíduo, incluindo seus ideais e os meios que divisa para alcançá-los, constitui seu "papel de vida". Coerentemente, a este papel o indivíduo subordina suas emoções e desejos específicos. O papel de vida forma-se na primeira infância, sob influência de fatores como ordem de nascimento, inferioridade ou superioridade física, e descaso ou super proteção dos pais.

A busca pela perfeição como fator motivacional humano. Essa busca se expressa por diferentes mecanismos: a relação e a adaptação social; a preocupação do indivíduo em alcançar objetivos preestabelecidos; a luta pela superioridade (incluindo voracidade pelo poder e pela notoriedade); agressividade (em particular frente à frustração), que seria o instinto primário aos quais todos os demais estariam subordinados.

Codificamos, interpretamos seletivamente e desenvolvemos assim um esquema de apercepção individualizado, formando um padrão de relação com o mundo que é distinto de todos os outros e pertence apenas a cada um de nós. Cada indivíduo é essencialmente livre e é, devido a essa liberdade, responsável pelas suas ações e pela sua vida.

Cada pessoa é uma totalidade integrada num sistema social. Cada ser humano é uma entidade única, indivisível, coerente e unificada que tem sempre de ser considerada em relação ao contexto sócio-ecológico de qual é parte integrante. A vida é essencialmente um movimento em direção a uma melhor adaptação ao ambiente, maior cooperação e altruísmo; cada pessoa é o agente criativo de sua própria personalidade, do seu próprio estilo de vida, dirigindo e criando ativamente o seu próprio crescimento.

O meio social e a preocupação contínua do indivíduo em alcançar objetivos preestabelecidos são os determinantes básicos do comportamento humano, o que inclui a sede de poder e a notoriedade. Os complexos de inferioridade, provocados pelo conflito com o envolvimento social, podem traduzir-se numa dinâmica patológica que deve ser tratada de um ponto de vista psicoterapêutico.

O indivíduo que não está interessado no seu semelhante é que tem as maiores dificuldades na vida e causa os maiores males aos outros.

Os objetivos que as pessoas se propõem atingir e os modelos característicos de seu comportamento para atingir os objetivos propostos fornecem a chave para a compreensão do significado que atribuem às suas próprias vidas.

Integração do indivíduo na sociedade é o alvo o que exige um esforço muito difícil de alcançar e uma espécie de equilíbrio psicofísico.

As pessoas sadias são aquelas socialmente úteis, apresentam interesse social e energia para atingir seus objetivos.

Interesse social é uma predisposição alimentada pela experiência para contribuir para a sociedade, mais do que interesse pela sociedade, pelo outro, o conceito implica uma noção de sentimento de comunidade que introduz a idéia de interesse pelos outros não apenas para servir aos nossos próprios objetivos, mas, para desenvolver um interesse pelo interesse dos outros.

A visão do ser humano é holística: unidade de estilo de vida, interesse social ou sentimento de comunidade.

Considera o ser humano em sua relação à totalidade do meio, através de uma abordagem humanista, holística. Necessidade de ver o homem como um todo, unidade funcional, reagindo ao seu meio tanto quanto aos seus próprios dotes físicos, em lugar de vê-lo como um somatório de instintos, desejos e outras manifestações psicológicas.

Encara o homem não apenas como um todo unificado, mas também como parte de outros todos (família, comunidade, sociedade e humanidade). As nossas vidas e todas as nossas atividades desenrolam-se num contexto social.

Necessidade de ver o homem como um todo, unidade funcional, reagindo ao meio tanto quanto aos seus próprios dotes físicos, em lugar de vê-lo como um somatório de instintos, desejos e outras manifestações psicológicas.

O instinto fundamental a ser desenvolvido é o social do qual derivam os sentimentos de amor, amizade, ternura, altruísmo. Tal instituto deve ser reforçado pelos pais e pela educação para não ser perdido. Os pais devem trabalhar a empatia, ou seja, o sentimento de ajudar os outros.

Pelos cinco anos de idade o estilo de vida de cada indivíduo está basicamente determinado, novas experiências podem contribuir para pequenas oscilações, mas a estrutura básica está moldada e adquirimos o estilo que vai caracterizar-nos ao longo da vida.

Certos estilos de vida desenvolvem em função não apenas da relação entre pais e filhos, mas também do tamanho da família, relação entre irmãos e posição ordinal da criança na família. Embora os irmãos tenham os mesmos pais e cresçam quase no mesmo cenário familiar, os seus ambientes sociais não são idênticos. Experiências em ser mais velho ou mais novo que os seus irmãos e estar exposto a atitudes e valores parentais que variam devido a chegada de mais crianças ou outras circunstâncias específicas criam condições únicas na infância que vão influenciar profundamente a formação do estilo de vida de qualquer indivíduo.

A luta construtiva pela superioridade, com forte interesse social e cooperação são os traços básicos do indivíduo saudável.

A vontade de ter poder é importante nos assuntos humanos como o aspecto sexual. A frustração de ter poder cria o complexo inferioridade, um sentimento de fracasso que é a raiz de muitos transtornos.

As grandes tarefas com que cada indivíduo é confrontado são o trabalho, a amizade e o amor. Estas três tarefas estão inter-relacionadas e sucesso nunca conduz sucesso nas outras; elas são no fundo aspectos diferentes do mesmo problema, como viver construtivamente no nosso ambiente.

A saúde mental é caracterizada pela razão, interesse social, e autotranscendência, e as desordens mentais por sentimentos de inferioridade e preocupação egocêntrica com segurança e superioridade ou poder sobre os outros.

3 Aspectos Negativos na Infância

Três condições que dominam a infância e são especialmente negativos:

Inferioridade orgânica: tornam-se auto-centrados e desenvolvem um sentimento de inferioridade e inabilidade para competir com outras pessoas

Crianças mimadas: tem dificuldades para desenvolver interesse social e cooperação e não possuem confiança nas suas capacidades porque sempre tiveram quem fizesse por elas o que elas deveriam ter feito sozinhas, em vez de cooperar com os outros tendem a fazer exigências unilaterais aos amigos e famílias.

Crianças negligenciadas: nunca conhecem o amor e a cooperação pelo que se torna extremamente difícil desenvolver estas capacidades, não tem confiança na sua aptidão para ser útil e ganhar o afeto e a estima dos outros.

A inferioridade física, o mimo e crianças negligenciadas resultam frequentemente em visões distorcidas do mundo, que levam a estilos de vida não adequados.

4 Personalidades Tendentes a Doenças Psíquicas

Agrupou as personalidades humanas tendentes à doença psíquica em três tipos:

1) Tendência a agressividade e dominação o que resulta no sadismo; dependência química, suicídio.

2) Submissão ou dependência resulta a desenvolver fobias, obsessões, compulsões e histerias.

3) Fuga dos objetivos ou da sociedade leva a psicose (fogem completamente da lógica da vida social)

5 Sentimento de Inferioridade

Os pais estabelecem os valores familiares e criam a atmosfera familiar e as crianças decidem qual o seu papel nessa família.

Os objetivos de vida são sempre algo irrealista e podem tornar-se neuroticamente sobrevalorizados se os sentimentos de inferioridade forem demasiado fortes. São estes objetivos que direcionam e dão sentido às nossas atividades; os nossos traços de personalidade não são inatos nem imutáveis, mas apenas traços adotados como modas de orientação na tentativa de atingir os objetivos.

As pessoas tentam compensar psicologicamente seus sentimentos de inferioridade devidos a suas próprias deficiências.

Pessoas com algumas características de inferioridade eventualmente compensam essas fraquezas, assim sendo, a inferioridade pode tornar a sua maior força. A psicanálise não interessa pelo defeito em si, mas pela atitude da pessoa em relação a esse defeito.

Todos nós temos uma predisposição para desenvolver sentimentos de inferioridade, já que nascemos muito fracos e morreríamos sem o prolongado período de dependência dos outros. Durante bastante tempo somos dominados por poderosos adultos que, além de maiores, são mais inteligentes do que nós. Os sentimentos de inferioridade são a nossa mais importante motivação e que todo o progresso resulta da nossa tentativa de compensar esses sentimentos de inferioridade.

Existe um empenho por auto-estima e tentativa de superar o sentimento de inferioridade por meio da procura compensatória de poder, domínio, superioridade, que são alcançados por suas atividades e interesse social no bem comum. Toda criança possui o sentimento de inferioridade por comparação realista com os adultos, maiores e mais hábeis, cuja superação seria sua principal meta na vida.

Não é de estranhar que nós percebemos como inferiores e nos proponhamos a partir daí a compensar as nossas fraquezas. A compensação é uma reação adaptativa e positiva que nos permite aproximar do nosso potencial total; uma incapacidade de efetuar compensação adequada pode originar um sentimento de inferioridade. A luta pelo poder seria então das primeiras compensações de um sentimento de inferioridade.

Para superar sentimento de inferioridade, os indivíduos desenvolvem um estilo de vida, que faz de cada personalidade uma personalidade única: embora todos procurem ultrapassar os sentimentos de inferioridade infantil, embora todos persigam o mesmo objetivo básico, nenhum o faz exatamente da mesma maneira de vida. Existe uma forma individual de adaptar-se e interagir com a vida em geral.

6 Perturbações Psicológicas

A falta de cooperação e o resultante sentimento de inferioridade e fracasso são responsáveis pelas perturbações psicológicas.

Perturbações Psicológicas: ocorre quando um indivíduo se sente inferiorizado e indigno de ocupar um lugar entre as pessoas. O interesse social, que é uma potencialidade inata de qualquer humano, não se desenvolve na presença de fortes sentimentos de inferioridade. Estes são substituídos por uma luta compensatória pela superioridade pessoal.

Neurótico: tendência para encontrar desculpas que explicam por que é que o objetivo não é atingido.

Psicótico: fogem completamente da lógica da vida social e adotam uma realidade de ilusões e alucinações que se ajusta à sua lógica privada. Rejeitam absolutamente o senso comum e são motivados apenas pelos seus próprios interesses. Não possui consciência de suas ações.

Qualquer mudança comportamental é superficial se não for acompanhada por uma alteração de percepção e um aumento do interesse social. Substituir comportamentos inaceitáveis por outros mais adequados não constitui uma mudança do estilo de vida se o indivíduo continuar a não se sentir igual aos outros seres humanos.

7 Psicoterapia

Psicoterapia: pretende-se que os clientes se apercebam das suas idéias enganosas e objetivos irrealistas; reorientação dos objetivos e reajustamento dos conceitos e atitudes pessoais. Os sentimentos de inferioridade dos clientes são suplantados por um crescente interesse social; sentem-se encorajados ao reconhecer que são iguais a qualquer outro ser humano.

O psicoterapeuta conduz o paciente a perceber seu estilo de vida e a orientá-lo e reeducá-lo para melhorar sua situação real, sem qualquer exploração dos conflitos inconscientes. O paciente é encorajado a ações concretas que possam facilitar a sua vida real, como trocar óculos por lentes de contato, caso o paciente sinta inferioridade usando óculos.

O psicoterapeuta deve ajudar o paciente a construir a sua própria personalidade.

A relação estabelecida entre terapeuta e cliente é de igualdade e procura-se uma atmosfera de confiança e aceitação.

Terapeuta: recolhe informações que lhes permite compreender o estilo de vida do cliente. O terapeuta vai gradualmente descobrindo e compreendendo a lógica privada do cliente, e expondo as suas interpretações na forma de hipóteses para que o cliente reconheça que são (ou não) interpretações corretas.

O terapeuta não deve buscar a verdade nem se preocupar com interpretações subjetivas do que se passa na sessão. A relação a ser desenvolvida entre terapeuta e paciente deve ser igualitária, face a face e empática.

Referências

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MIJOLLA, Alain de. Dicionário internacional de psicanálise: conceitos, noções, biografias, obras, eventos, instituições. Rio de Janeiro: Imago Ed., 2005.

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ZIMERMAN, David. Vocabulário contemporâneo de psicanálise. Porto Alegre: Artmed, 2001.



Teoria Psicanalítica de Freud

Marcos Spagnuolo Souza

1 Biografia

Sigmund Freud nasceu em 1836, aos quatro anos de idade sua família transferiu-se para Viena por problemas financeiros. Morou em Viena até 1938, quando, com a vinda do nazismo foge para a Inglaterra. Nos tempos do nazismo, Freud perdeu quatro irmãs que morreram nos campos de concentração.

Em Setembro de 1886 Freud casa-se com Martha Bernays, com a ajuda financeira de alguns amigos mais abastados, dentre eles Josef Breuer, um colega mais velho da faculdade de medicina. Foi com as discussões de casos clínicos com Breuer que surgiram as idéias que culminaram com a publicação dos primeiros artigos sobre a psicanálise.

Freud e Martha Bernays tiveram seis filhos. Um dos filhos (Martin Freud) escreveu uma memória intitulada “Freud: Homem e Pai”, na qual o descreve como um homem que trabalhava extremamente, por longas horas, mas adorava ficar com seus filhos durante férias de verão. A filha Anna Freud foi também psicanalista

Freud, dedica-se a anotar e analisar seus próprios sonhos, remetendo-os à sua própria infância e, no processo, determinando as raízes de suas próprias neuroses. Tais anotações tornam-se a fonte para a obra “A Interpretação dos Sonhos”. Durante o curso desta auto-análise, Freud chega à conclusão de que seus próprios problemas eram devidos a uma atração por sua mãe e a uma hostilidade ao seu pai. É o famoso "complexo de édipo", que se torna o coração da teoria de Freud sobre a origem da neurose em todos os seus pacientes.

Freud morre de cancer na mandíbula aos 83 anos de idade (passou por trinta e três cirurgias). Supõe-se que tenha morrido de uma overdose de morfina. Freud sentia muita dor, e segundo a história contada, ele teria dito ao médico que lhe aplicasse uma dose excessiva de morfina para terminar com o sofrimento.

2 Estrutura e Dinâmica da Personalidade

Freud imaginava a psique do ser humano como um sistema de energia: Cada pessoa é movida, segundo ele, por uma quantidade limitada de energia psíquica. Isso significa, por um lado, que se grande parte da energia for necessária para a realização de determinado objetivo (ex. expressão artística) ela não estará disponível para outros objetivos (ex. sexualidade); por outro lado, se a pessoa não puder dar vasão à sua energia por um canal (ex. sexualidade), terá de fazê-lo por outro (ex. expressão artística).

Essa energia provém das pulsões. O ser humano possui duas pulsões inatas, a sexual e a agressiva. Essas duas pulsões opõem-se ao ideal da sociedade e, por isso, precisam ser controladas através da educação, de forma que a energia gerada pelas pulsões não podem ser liberadas de maneira direta. O ser humano é, assim, sexual e agressivo por natureza e a função da sociedade é amansar essas tendências naturais do homem. O não poder dar vazão a essa energia gera no indivíduo um estado de tensão interna que necessita ser resolvido. Toda ação do homem é motivada pela busca de dar vazão à energia psíquica acumulada.

3 Modelo Topológico da Mente

O consciente: abarca todos os fenômenos que em determinado momento podem ser percebidos de maneira conscientes pelo indivíduo;

O pré-consciente: fenômenos que não estão conscientes em determinado momento, mas podem tornar-se, se o indivíduo desejar se ocupar com eles;

O inconsciente: diz respeito aos fenômenos e conteúdos que não são conscientes e somente sob circunstâncias muito especiais podem tornar-se.

Freud não foi o primeiro a propor que parte da vida psíquica se desenvolve inconscientemente. Ele foi, no entanto, o primeiro a pesquisar profundamente esse território. Segundo ele, os desejos e pensamentos humanos produzem muitas vezes conteúdos que causariam medo ao indivíduo, se não fossem armazenados no inconsciente. Este tem assim uma função importantíssima de estabilização da vida consciente. Sua investigação levou-o a propor que o inconsciente é alógico (e por isso aberto a contradições); atemporal e aespacial (ou seja, conteúdos pertencentes a épocas ou espaços diferentes podem estar próximas). Os sonhos são vistos como expressão simbólica dos conteúdos inconscientes.

Através da compreensão do conceito de inconsciente torna-se clara a compreensão da motivação na psicanálise clássica: Muitos desejos, sentimentos e motivos são inconscientes, por serem muitos dolorosos para se tornarem conscientes. No entanto esse conteúdo inconsciente influencia a experiência consciente da pessoa, por exemplo, através de atos falhos, comportamentos aparentemente irracionais, emoções inexplicáveis, medo, depressão, sentimento de culpa. Assim, os sentimentos, sonhos, desejos e motivos inconscientes influenciam e guiam o comportamento consciente.



4 Modelo Estrutural da Personalidade

Freud desenvolveu mais tarde (1923) um modelo estrutural da personalidade, em que o aparelho psíquico se organiza em três estruturas.

Id: O id é a fonte da energia psíquica (líbido). O id é formado pelas pulsões - instintos, impulsos orgânicos e desejos inconscientes. Ele funciona segundo o princípio do prazer (al. Lustprinzip), ou seja busca sempre o que produz prazer e evita o que é aversivo, e somente segundo ele. Não faz planos, não espera, busca uma solução imediata para as tensões, não aceita frustrações e não conhece inibição. Ele não tem contato com a realidade e uma satisfação na fantasia pode ter o mesmo efeito de uma atingida través de uma ação. O id desconhece juízo, lógica, valores, ética ou moral, sendo exigente, impulsivo, cego irracional, anti-social, egoísta e dirigido ao prazer. O id é completamente inconsciente.

Ego: O ego desenvolve-se a partir do id com o objetivo de permitir que seus impulsos sejam eficientes, ou seja, levando em conta o mundo externo: é o chamado princípio da realidade. É esse princípio que introduz a razão, o planejamento e a espera ao comportamento humano: a satisfação das pulsões é retardada até o momento em que a realidade permita satisfazê-las com um máximo de prazer e um mínimo de consequências negativas. A principal função do ego é buscar uma harmonização inicialmente entre os desejos do id e a realidade e, posteriormente, entre esses e as exigências do superego.

Superego: É a parte moral da mente humana e representa os valores da sociedade. O superego tem três objetivos: (1) inibir (através de punição ou sentimento de culpa) qualquer impulso contrário às regras e ideais por ele ditados (2) forçar o ego a se comportar de maneira moral (mesmo que irracional) e (3) conduzir o indivíduo à perfeição - em gestos, pensamentos e palavras. O superego forma-se após o ego, durante o esforço da criança de introjetar os valores recebidos dos pais e da sociedade a fim de receber amor e afeição. Ele pode funcionar de uma maneira bastante primitiva, punindo o indivíduo não apenas por ações praticadas, mas também por pensamentos; outra característica sua é o pensamento dualista (tudo ou nada; certo ou errado, sem meio-termo). O superego divide-se em dois subsistemas: o ego ideal, que dita o bem ser procurado, e consciência, que determina o mal a ser evitado.

5 Mecanismos de Defesa

O ego está, assim, constantemente sob tensão na sua tentativa de harmonizar a ação do id, do mundo exterior e do superego. Quando essa tensão, normalmente sob a forma de medo, se torna grande demais que ameaça a estabilidade do ego, este poder fazer uso dos mecanismos de defesa ou ajustamentos. Estes são estratégias do ego para diminuir o medo através de uma deformação da realidade - dessa forma o ego exclui da consciência conteúdos indesejados. O mecanismos de defesa satisfazem os desejos do id apenas parcialmente, mas, para este, uma satisfação parcial é melhor do que nenhuma.

Repressão: é o processo pelo qual se afastam da consciência conflitos e frustrações demasiadamente dolorosos para serem experimentados ou lembrados, reprimindo-os e recalcando-os para o inconsciente; o que é desagradável é, assim, esquecido;

Formação Reativa: consiste em ostentar um procedimento e externar sentimentos opostos aos impulsos verdadeiros, indesejados.

Projeção: consiste em atribuir a outros as idéias e tendências que o sujeito não pode admitir como suas.

Regressão: consioste em a pessoa retornar a comportamentos imaturos, característicos de fase de desenvolvimento que a pessoa já passou.

Fixação: é um congelamento no desenvolvimento, que é impedido de continuar. Uma parte da libido permanece ligada a um determinado estágio do desenvolvimento e não perite que a criança passe completamente para o próximo estádio. A fixação está relacionada com a regressão, uma vez que a probabilidade de uma regressão a um determinado estádio do desenvolvimento aumenta se a pessoa desenvolveu uma fixação nesse estádio.

Sublimação: é a satisfação de um impulso inaceitável através de um comportamento socialmente aceito.

Identificação: é o processo pelo qual um indivíduo assimila um aspecto, uma característica de outro. Uma forma especial de identificação é a identificação com o agressor.

Deslocamento: é o processo pelo qual agressões ou outros impulsos indesejáveis, não podendo ser direcionados à(s) pessoa(s) a que se referem, são direcionadas a terceiros.

6 As fases do Desenvolvimento Psicosexual

Uma importante parte da teoria freudiana é dedicada ao desenvolvimento da personalidade. Duas hipóteses caracterizam sua teoria:

Freud foi o primeiro a afirmar que os primeiros anos das vida são os mais importantes para o desenvolvimento da pessoa e

o desenvolvimento do indivíduo se dá em fases ou estádios psico-sexuais. Freud foi, assim, o primeiro autor a afirmar que as crianças também têm uma sexualidade.

Freud descreve quatro fases distintas, pelas quais a criança passa em seu desenvolvimento. Cada uma dessas fases é definida pela região do corpo a que as pulsões se direcionam. Em cada fase surgem novas necessidades que exigem ser satisfeitas; a meneira como essas necessidades são satisfeitas determina como a criança se relaciona com outras pessoas e quais sentimentos ela tem para consigo mesma. A transição de uma fase para outra é biologicamente determinada, de tal forma que uma nova fase pode iniciar sem que os processos da fase anterior tenha se completado. As fases se seguem umas às outras em uma ordem fixa e, apesar de uma fase se desenvolver a partir da anterior, os processos desencadeados em uma fase nunca estão plenamente completos e continuam agindo durante toda a vida da pessoa.

A fase oral

A primeira fase do desenvolvimento é a fase oral, que se estende desde o nascimento até aproximadamente um ano de vida. Nessa fase a criança vivencia prazer e dor através da satisfação (ou frustação) de pulsões orais, ou seja, pela boca. Essa satisfação se dá independente da satisfação da fome. Assim, para a criança sugar, mastigar, comer, morder, cuspir etc. têm uma função ligada ao prazer, além de servirem à alimentação. Ao ser confrontada com frustações a criança é obrigada a desenvolver mecanismos para lidar com tais frustações. Esses mecanismos são a base da futura personalidade da pessoa. Assim, uma satisfação insuficiente das pulsões orais pode conduzir a uma tendência para ansiedade e pessimismo; já uma excessiva satisfação pode levar, através de uma fixação nessa fase, a dificuldades de aceitar novos objetos como fonte de prazer/dor em fases posteriores, aumentando assim a probabilidade de uma regressão.

A fase oral se divide em duas fases menores, definidas pelo nascimento dos dentes. Até então a criança se encontra em uma fase passiva-receptiva; com os primeiros dentes a criança passa a uma fase sádica-ativa através da possibilidade de morder. O pricipal objeto de ambas as fases, o seio materno, se torna, assim, um objeto ambivalente. Essa ambivalência caracteriza a maior parte dos relacionamentos humanos, tanto com pessoas como com objetos.

A fase oral apresenta, assim, cinco modos de funcionamento que podem se desenvolver em características da personalidade adulta:

O incorporar do alimento se mostra no adulto como um "incorporar" de saber ou poder, ou ainda como a capacidade de se identificar com outras pessos ou de se integrar em grupos;

O segurar o seio, não querendo se separar dele, se mostram posteriormente como persistência e perseverança ou ainda como decisão;

Morder é o protótipo da destrutividade, assim do sarcasmo, cinismo e tirania;

Cuspir se transforma em rejeição e

O fechar a boca, impedindo a alimentação, conduz a rejeição, negatividade ou introversão.

O principal processo na fase oral é a criação da ligação entre mãe e filho.

A fase anal

A segunda fase, segundo Freud, é a fase anal, que vai aproximadamente do primeiro ao terceiro ano de vida. Nessa fase a satisfação das pulsões se dirige ao ânus, ao controle da tensão intestinal. Nessa fase a criança tem de aprender a controlar sua defecação e, dessa forma, deve aprender a lidar com a frustração do desejo de satisfazer suas necessidades imediatamente. Como na fase oral, também os mecanismos desenvolvidos nesta fase influenciam o desenvolvimento da personalidade. O defecar imediato e descontrolado é o protótipo dos ataques de raiva; já uma educação muito rígida com relação à higiene pode conduzir tanto a uma tendência ao caos, aos descuido, à bagunça quanto a uma tendência a uma organização compulsiva e exageradamente controlada. Se a mãe faz elogios demais ao fato de a criança conseguir esperar até o banheiro, pode surgir uma ligação entre dar (as fezes) e receber amor, e a pessoa pode desenvolver generosidade; se a mãe supervaloriza essas necessidades biológicas, a criança pode se desenvolver criativa e e produtiva ou, pelo contrário, se tornar depressiva, caso ela não corresponda às expectativas; crianças que se recusam a defecar podem se desenvolver como colecionadores, coletores ou avaros.

A fase fálica

A fase fálica, que vai dos três aos cinco anos de vida, se caracteriza segundo Freud pela importância da presença (ou, nas meninas, da ausência) do falo ou pênis; nessa fase prazer e desprazer estão, assim, centrados na região genital. As dificuldades dessa fase estão ligadas ao direcionamento da pulsão sexual ou libidinosa ao genitor do sexo oposto e aos problemas resultantes. A resolução desse conflito está relacionada ao complexo de Édipo e à identificação com o genitor de mesmo sexo.

Freud desenvolveu sua teoria tendo sobretudo os meninos em vista, uma vez que, para ele, estes vevnciariam o conflito da fase fálica de maneira mais intensa e ameaçadora. Segundo Freud o menino deseja nessa fase ter a mãe só para si e não partilhá-la mais com o pai; ao mesmo tempo ele teme ser que o pai se vingue, castrando-o. A solução para esse conflito consiste na repressão tanto do desejo libidinoso com relação à mãe como dos sentimentos agressivos para com o pai; em um segundo momento realiza-se a identificação do menino com seu pai, o que os aproxima e conduz, assim, a uma internalização por parte do menino dos valores, convicções, interesses e posturas do pai. O complexo de Édipo representa um importante passo na formação do superego e na socialização dos meninos, uma vez que o menino aprende a seguir os valores dos pais. Essa solução de compromisso permite que tanto o ego (através da diminuição do medo) e o id (por o menino poder possuir a mãe indiretamente através do pai, com o qual ele se identifica) sejam parcialmente satisfeitos.

O conflito vivenciado pelas meninas é parecido, mas menos intenso. A menina deseja o próprio pai, em parte devido à inveja que sente por não ter um pênis (al. Penisneid); ela sente-se castrada e dá a culpa à própria mãe. Por outro lado, a mãe representa uma ameaça menos séria, uma vez que uma castração não é possível. Devido a essa situação diferente, a identificação da menina com a própria mãe é menos forte do que a do menino com seu pai e, por isso, as meninas teriam uma consciência menos desenvolvida - afirmação esta que foi rejeitada pela pesquisa empírica. Freud usou o termo "complexo de Édipo" para ambos os sexos; autores posteriores limitaram o uso da expressão aos meninos, reservando para as meninas o termo "complexo de Eletra”.

A apresentação do complexo de Édipo dada acima é, no entanto, simplificada. Na realidade o resultado da resolução do complexo de Édipo é sempre um identificação como ambos os pais e a força de cada uma dessas identificações depende de diferentes fatores, como a relação entre os elementos masculinos e femininos na predisposição fisiológica da criança ou a intensidade do medo de castração ou da inveja do pênis. Além disso, a mãe mantém em ambos os sexos um papel primordial, permanecendo sempre o principal objeto da libido..

A fase genital

A última fase do desenvolvimento psicossocial é a fase genital, que se dá durante a adolescencia. Nessa fase as pulsões sexuais, depois da longa fase de latência e acompanhando as mudanças corporais, despertam-se novamente, mas desta vez se dirigem a uma pessoa do sexo oposto. Como se depreende da explanação anterior, a escolha do parceiro não se dá independente dos processos de desenvolvimento anteriores, mas é influenciada pela vivência nas fases anteriores. Além disso, apesar de continuarem agindo durante tod a vida do indivíduo, os conflitos internos típicos das fases anteriores atingem na fase genital uma relativa estabilidade conduzindo a pessoa a uma estrutura do ego que lhe permite enfrentar os desafios da idade adulta.

7 A Teoria Psicanalítica dos Transtornos Mentais

A melhor maneira de definir “distúrbio” é caracterizá-lo como deficiência psicológica com repercussão na área emocional e interpessoal. Este termo caracteriza uma faixa que vai desde formas neuróticas leves até a loucura, na plenitude do seu termo. "Normal" seria aquela personalidade com capacidade de viver eficientemente, manter um relacionamento duradouro e emocionalmente satisfatório com outras pessoas, trabalhar produtivamente, repousar e divertir-se, ser capaz de julgar realisticamente suas falhas e qualidades, aceitando-as. A falha de uma ou outra dessas características pode indicar a presença de uma deficiência psicológica ou “distúrbio” mental.

Classificam-se os distúrbios mentais em 3 grandes tipos básicos:

1º Tipo: Neurose

É a existência de tensão excessiva e prolongada, de conflito persistente ou de uma necessidade longamente frustrada, é sinal de que na pessoa se instalou um estado neurótico. A neurose determina uma modificação, mas não uma desestruturação da personalidade e muito menos de perda de valores da realidade. Costuma-se catalogar os sintomas neuróticos em certas categorias, como:

a) Ansiedade: a pessoa é tomada por sentimentos generalizados e persistente de intensa angústia sem causa objetiva. Alguns sintomas são: palpitações do coração, tremores, falta de ar, suor, náuseas. Há uma exagerada e ansiosa preocupação por si mesmo.

b) Fobias: uma área da personalidade passa a ser possuída por respostas de medo e ansiedade. Na angústia o medo é difuso e quando vem à tona é sinal de que já existia, há longo tempo. Se apresenta envolta em muita tensão, preocupação, excitação e desorganização do comportamento. Na reação fóbica, o medo se restringe a uma classe limitada de estímulos. Verifica-se a associação do medo a certos objetos, animais ou situações.

c) Obsessiva-Compulsiva: A Obsessão é um termo que se refere a idéias que se impõem repetidamente à consciência. São por isto dificilmente controláveis. A compulsão refere-se a impulsos que levam à ação. Está intimamente ligada a uma desordem psicológia chamada transtornos obsessivo-compulsivo.

2º Tipo: Psicoses

O psicótico pode encontrar-se ora em estado de depressão, ora em estado de extrema euforia e agitação. Em dado momento age de um modo e em outro se comporta de maneira totalmente diferente. Houve uma desestruturação da sua personalidade. O dado clínico para se aferir à psicose é a alteração dos juízos da realidade. O psicótico passa a perceber a realidade de maneira diferente. Por isso, faz afirmações e tem percepções não apoiadas nem justificadas pelos dados e situações reais. Nas psicoses, além da alteração do comportamento, são comuns alucinações (ouvir vozes, ter visões e delírios). Pode ser possuído por intensas fantasias de grandeza ou perseguição. Pode sentir-se vítima de uma conspiração assim como se julgar milionário, um ser divino, etc. As Psicoses se manifestam como:

a) Esquizofrenia: apatia emocional, carência de ambições, desorganização geral da personalidade, perda de interesse pela vida nas realizações pessoais e sociais. pensamento desorganizado, afeto superficial e inapropriado,riso insólito, bobice, infantilidade, hipocondria, delírios e alucinações transitórias.

b) Depressão: o estado depressivo, ao contrário, caracteriza-se por inatividade e desalento. Seus sintomas são: pesar, tristeza, desânimo, falta de ação, crises de choro, perda de interesse pelo trabalho, por amigos e família, bem como por suas distrações habituais. Torna-se lento na fala, não dorme bem à noite, perde o apetite, pode ficar um tanto irritado e muito preocupado.

c) Paranóia: caracteriza-se sobretudo por ilusões fixas. É um sistema delirante. As ilusões de perseguição e de grandeza são mais duradouras do que na esquizofrenia paranoide. Os ressentimentos são profundos. É agressivo, egocêntrico e destruidor. Acredita que os fins justificam os meios e é incapaz de solicitar carinho. Não confia em ninguém

3º Tipo: Psicopatias

Os psicopatas não estruturam determinadas dimensões da personalidade, verificando-se uma espécie de falha na própria construção. Os principais sintomas das psicopatias são: Diminuição ou ausência da consciência moral. O certo e o errado; o permitido e o proibido não fazem sentido para eles. Desta maneira, simular, dissimular, enganar, roubar, assaltar, matar, não causam sentimentos de repulsa e remorso, em suas consciências. O único valor para eles é seus interesses egoístas: Inexistência de alucinações; ausência de manifestações neuróticas; falta de confiança; Busca de estimulações fortes; Incapacidade de adiar satisfações; Não toleram um esforço rotineiro e não sabem lutar por um objetivo distante; Não aprendem com os próprios erros, pelo fato de não reconhecerem estes erros; Em geral, têm bom nível de inteligência e baixa capacidade afetiva; Parecem incapazes de se envolver emocionalmente. Não entendem o que seja socialmente produtivo.

Referências

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