segunda-feira, 29 de novembro de 2010

Personificações do Arquétipo Ingênuo

Marcos Spagnuolo Souza
A estrutura somática de cada ser humano é a manifestação ou reflexos da estrutura psíquica que possui a seguinte cartografia: persona; inconsciente pessoal; inconsciente coletivo e o si-mesmo que é o nosso verdadeiro ser em estado de potência. O inconsciente coletivo tem um efeito direto sobre o consciente, quer a consciência o compreenda ou não. O inconsciente coletivo é formado pelos seguintes arquétipos: os leviatãs; anima; animus; velho ancião; símbolos de transformações arcaicas e finalmente o arquétipo da ingenuidade. O nosso objetivo no momento é estudarmos o arquétipo ingênuo.
O arquétipo ingênuo é uma estrutura arquetípica antiguíssima, sendo o reflexo fiel de uma consciência humana indiferenciada em todos os aspectos, correspondente a uma psique que, por assim dizer, ainda não deixou o nível animal. Consciência primitiva ou bárbara tendo uma auto-imagem em um nível anterior de desenvolvimento. Personalidade de caráter pueril, inferior e totalmente infantil. Festas como o carnaval e outras semelhantes são reflexos ou descendentes da figura numinosa do arquétipo ingênuo.
 Os traços do arquétipo ingênuo possuem relação com certas figuras folclóricas conhecidas nos contos de fada: Dunga, o João Bobo e o Palhaço. O arquétipo ingênuo se manifesta em fenômeno conhecido como poltergeist, que sempre sucederam em todo tempo e lugar.
As travessuras engraçadas ou maliciosas deste arquétipo ingênuo são tão conhecidas quanto seu baixo nível de inteligência, isto é, a tolice notória de suas "comunicações". Diante de suas brincadeiras ele pode inclusive se transforma em animais, afetando diretamente a consciência das pessoas. 
Embora o arquétipo ingênuo não seja propriamente mau, comete, devido à sua inconsciência e falta de relacionamento, as maiores atrocidades. Seu cativeiro na inconsciência animal é sugerido por sua prisão no crânio de um alce.  
Atualmente reconhecemos que as celebrações das “Saturnalia” que eram as festas celebradas no ano novo são manifestações do arquétipo ingênuo. A “Saturnalia” na Antigüidade tratava-se das danças inofensivas dos sacerdotes, do clero inferior, das crianças e subdiáconos na Igreja. Nessa ocasião era escolhido um bispo das crianças, paramentado com vestes pontificais. Este fazia uma visita oficial ao palácio do arcebispo, acompanhado de uma grande balbúrdia, e de uma das janelas do palácio distribuía sua bênção episcopal. No fim do século XII, a “Saturnalia” já havia degenerado numa verdadeira festa de loucos. No ano de 1198, em Notre Dame (Paris), ocorreu excesso, atos infames, palavras sujas, como também pelo derramamento de sangue que o papa Inocêncio III manifestou-se, mas inutilmente, contra as brincadeiras escarnecedoras das loucuras dos clérigos. Trezentos anos mais tarde ( 12 de março de 1444) uma carta da Faculdade Teológica de Paris, endereçada a todos os bispos franceses, clama contra essa festa, em que "os próprios sacerdotes e clérigos escolhiam um arcebispo, ou bispo, ou papa, designando-o como o papa dos loucos.. No meio da missa, pessoas fantasiadas com máscaras grotescas ou de mulher, de leões ou de atores apresentavam suas danças, cantavam no coro canções indecentes, comiam comidas gordurosas num canto do altar, ao lado do celebrante da missa, jogavam os seus jogos preferidos. Incensavam com fumaça fedorenta, queimando o couro dos sapatos velhos e corriam e saltitavam por toda a Igreja.
O arquétipo ingênuo continua a ser uma fonte de divertimento que se prolonga através das civilizações, sendo reconhecível nas figuras carnavalescas de um polichinelo e de um palhaço.
Os arquétipos que estão no inconsciente coletivo e entre eles o arquétipo ingênuo costumam perder sua energia progressivamente, a não ser que receba energia de fora.
Podemos pensar que quando os aspectos obscuros desaparecem é porque não existem mais, mas, na realidade perderam energia em decorrência que as consciências se libertaram do fascínio do inconsciente coletivo, não o vivendo compulsivamente. Salientamos que os arquétipos não se desfazem em fumaça, mas recolhem-se no inconsciente devido à perda de energia, mas espera por uma oportunidade favorável para reaparecer com toda sua intensidade.
O arquétipo ingênuo se manifesta também em um nível de consciência dependente onde responsabilizamos a sociedade ou o outro por nossa própria ineficiência, devido à puerilidade que nos absorve. O nível de consciência que se coloca dependente do outro é fortemente influenciada pelo arquétipo ingênuo.
Somente quando atingimos um nível de consciência superior é possível destacar o estágio anterior como algo diverso de si mesmo e objetivá-lo, isto é, dizer algo a seu respeito, reconhecendo como sendo inferior. Enquanto a nossa consciência está no estágio inferior não é possível reconhecer o estágio de consciência ingênua.
A superação da consciência em relação ao arquétipo ingênuo é representada pela cabeça do falcão, ou por um falcão que voa nas alturas.
Referência
JUNG, Carl Gustav. Os arquétipos e o inconsciente coletivo. Petrópolis: Editora Vozes, 2002.


quinta-feira, 25 de novembro de 2010

Psicologia do Arquétipo da Criança

Marcos Spagnuolo Souza
A organização da psique humana possui a seguinte estrutura: persona, inconsciente e si-mesmo.
A persona situa-se no nível consciente e representa todos os ensinamentos que recebemos a partir do momento em que ocorre o nascimento.
No inconsciente existe duas categorias: 1)Inconsciente pessoal que indubitavelmente possui sua origem nas vivências pessoais reprimidas que são esquecidas, podendo ser inteiramente explicadas pela anamnese individual. 2) Inconsciente Coletivo (alma instintiva) de caráter impessoal que não pode ser atribuída a vivência do passado individual e conseqüentemente não pode ser explicada a partir de aquisições individuais. Inconsciente Coletivo corresponde a certos elementos estruturais coletivos (e não pessoais) que são herdadas tais como os elementos morfológicos do corpo humano.
Os produtos do inconsciente pessoal e coletivo surgem em um estado de intensidade reduzida da consciência (em sonhos, sonhos acordados, delírios, visões, etc). Nesses estados cessa a inibição provocada pela consciência sobre os conteúdos inconscientes, e assim jorra, como que saindo de portas laterais abertas, o material até então inconsciente, para o campo da consciência.
Na realidade nunca nos libertaremos legitimamente inconsciente pessoal e coletivo (alma instintiva), da mesma forma que não nos livraremos de nosso corpo e de seus órgãos sem cometer suicídio.
O ser humano primitivo não pensava, mas sim que "algo pensava dentro dele". Sua consciência era invadida pelo poderosíssimo inconsciente coletivo, daí o temor de influências mágicas que a qualquer momento podiam atravessar a sua intenção e por esse motivo ele estava cercado de poderes desconhecidos aos quais devia ajustar-se de algum modo. Devido ao crônico estado crepuscular de sua consciência, muitas vezes era quase impossível descobrir se ele apenas tinha sonhado alguma coisa ou se a viveu na realidade. O mundo mítico dos antepassados, por exemplo, o atacava constantemente.
A consciência do homem civilizado possui um instrumento eficaz para a realização de seus conteúdos através da dinâmica da razão, com o crescente fortalecimento desta última podendo perder-se na unilateralidade desviando-se do inconsciente pessoal, do inconsciente coletivo e do si-mesmo. Isso representa a possibilidade da liberdade humana, mas, por outro, é a fonte de infindáveis transgressões que o pode levar a loucura e a perda da alma (si-mesmo). O homem primitivo se caracteriza pelo fato de estar mais próximo do instinto, como o animal, pela neofobia (terror do que é novo) e pelo tradicionalismo. O ser humano é lamentavelmente atrasado enquanto nós exaltamos o progresso. Nossa valorização do progresso possibilita, por um lado, uma quantidade das mais agradáveis realizações do desejo, no entanto, por outro, acumula uma culpa prometèica, igualmente gigantesca, que exige de tempos em tempos uma expiação sob a forma de catástrofes fatais. Há muito a humanidade sonhava com o vôo e agora já chegamos aos bombardeios aéreos! Sorrimos hoje da esperança cristã no além e nós mesmos acabamos caindo em situações piores que a idéia de uma além-morte prazerosa.
O ideal retrógrado é sempre mais primitivo "mais moral", posto que se atem fielmente a leis tradicionais. O ideal progressista é sempre mais abstrato, não- natural e mais "amoral", na medida em que exige infidelidade à tradição. A característica retrógrada é mais próxima da naturalidade, sempre ameaçada, porém, de um despertar doloroso. Quanto mais a consciência se diferencia, tanto maior o perigo da sua separação da raiz. Quando mais o inconsciente coletivo é reprimido pela consciência, mais ele se apodera da consciência, chegando a destruí-la. Um progresso viável só pode ocorrer através da cooperação entre persona, inconsciente pessoal e coltivo.
A criança (si-mesmo) é o “símbolo” da salvação. Um aspecto fundamental do motivo da criança é o seu caráter de futuro. A criança é o futuro em potencial. Significa em regra geral uma antecipação de desenvolvimentos futuros.  A vida é um fluxo, um fluir para o futuro e não um dique que estanca e faz refluir. Não admira que tantas vezes que os salvadores míticos são crianças divinas. A criança pode ser expressa, por exemplo, pelo redondo, pelo círculo ou pela esfera, ou então pela quaternidade como outra forma de inteireza. A inteireza que transcende a consciência é o si-mesmo.
O si-mesmo, representado pela criança é "menor do que o pequeno e, no entanto, maior do que o grande" complementa a impotência da "criança" com os seus feitos igualmente maravilhosos.
O inconsciente pode nulificar a criança (si-mesmo). O perigo ou ameaças a criança é representado por dragões, cobras e vertebrados inferiores que são símbolos do substrato psíquico coletivo, cuja localização anatômica coincide com o cerebelo e a medula espinal. Estes órgãos constituem a serpente.
A criança, o si-mesmo é o herói que deve vencer o monstro da escuridão: a vitória esperada do si-mesmo sobre o inconsciente. Dia e luz são sinônimos do si-mesmo, noite e escuridão, do inconsciente. O nascimento da criança é provavelmente a experiência mais forte da existência humana. "E Deus disse: Faça-se a luz.!" A luz foi feita e a escuridão desapareceu.
A criança enjeitada, abandonada, o risco que está sujeita, e o nascimento misterioso descreve certa vivência psíquica de natureza criativa, cujo objetivo é a emergência de um conteúdo novo, ainda desconhecido. A nova configuração, a criança é a transcendência dos opostos.
Nada no mundo dá as boas-vindas a este novo nascimento, mas apesar disso ele é o fruto mais precioso e prenhe de futuro da própria natureza originária; significa em última análise um estágio mais avançado da auto-realização. "Criança" significa algo que se desenvolve rumo à autonomia. Ela não pode tornar-se sem desligar-se da origem: o abandono é uma condição necessária, não apenas um fenômeno secundário. O Menino Jesus, por exemplo, permanece uma necessidade cultural, enquanto a maioria das pessoas ainda é incapaz de realizar psicologicamente a frase bíblica: "A não ser que vos torneis como as criancinhas".
Como portadoras de luz, ou seja, amplificadoras da consciência, a criança vence a escuridão, ou seja, o estado inconsciente anterior. Uma consciência mais elevada, ou um saber que ultrapassa a consciência atual, é equivalente a estar sozinho no mundo, representado pela criança. A solidão expressa à oposição entre o portador ou o símbolo da consciência mais alta e o seu meio ambiente.
Chama a atenção o paradoxo presente em todos os mitos da criança, pelo fato dela estar entregue e indefesa frente a inimigos poderosíssimos e, constantemente ameaçada pelo perigo da extinção, mas possuindo forças que ultrapassam muito a medida humana. Esta afirmação se relaciona intimamente com o fato psicológico da "criança" ser "insignificante" por um lado, isto é, desconhecida, "apenas" uma criança, mas por outro, divina.
O mito enfatiza que a "criança" é dotada de um poder superior e que se impõe inesperadamente, apesar de todos os perigos. A "criança" nasce no útero do inconsciente, gerada no fundamento da natureza humana, ou melhor, da própria natureza viva. É uma personificação de forças vitais, que vão além do alcance limitado da nossa consciência, dos nossos caminhos e possibilidades, desconhecidos pela consciência e sua unilateralidade, e uma inteireza que abrange as profundidades da natureza. Ela representa o mais forte e inelutável impulso do ser, isto é, o impulso de realizar- se a si mesmo. O impulso e compulsão da auto-realização é uma lei da natureza e, por isso, tem uma força invencível, mesmo que o seu efeito seja no início insignificante e improvável.
 A criança corresponde ao que é "menor do que pequeno e maior do que grande": o si-mesmo, como fenômeno individual, "menor do que pequeno", mas como equivalente do mundo, "maior que o conhecimento do mundo e da consciência. Criança é o sujeito transcendente do conhecer, pólo oposto do universo empírico. A criança é o ovo dourado, que não é filho do homem e nem do mundo. O ovo sai do útero do vasto mundo, sendo por isso um acontecimento cósmico.
A criança é o símbolo que não aponta mais para trás, mas para frente, para uma meta ainda não atingida. Portador de cura e superação dos conflitos.
O ser originário bissexual torna-se símbolo da unidade da personalidade do si-mesmo, em que o conflito entre os opostos se apazigua.
Psicologicamente, esta afirmação significa que a "criança" simboliza a essência humana pré-consciente e pós-consciente. O seu ser pré-consciente é o estado inconsciente da primeiríssima infância; o pós-consciente é uma antecipação da vida além da morte.
Referencia
JUNG, Carl Gustav. Os arquétipos e o inconsciente coletivo. Petrópolis: Editora Vozes, 2002.



quinta-feira, 18 de novembro de 2010

Possessões e Renascimentos

Marcos Spagnuolo Souza
Esse artigo é o resumo do capítulo denominado “Sobre o Renascimento” do livro “Os Arquétipos e o Inconsciente Coletivo” de JUNG, Carl Gustav.
A psique está em constante movimento de potência para ato, em transformação ininterrupta passando pela metempsicose, reencarnação, renascimento e finalmente ressurreição. Depois da ressurreição inicia uma evolução que não é humana e sim angélica.
A metempsicose: trata-se da idéia de uma vida que se estende no tempo, passando por vários corpos, inclusive dos vegetais, animais e humano.
Reencarnação: contém o conceito de continuidade pessoal em vários corpos humanos. Neste caso, a personalidade humana é considerada suscetível de continuidade e memória; ao reencarnar ou renascer temos, por assim dizer potencialmente, a condição de lembrar-nos de novo das vidas anteriores, que nos pertenceram. Na reencarnação trata-se em geral de um renascimento em corpos humanos.
Renascimento: renascimento durante a vida individual. Renovação ou aperfeiçoamento sem modificações do corpo físico, personalidade renovada. Estados de doença corporal também podem ser curados através de cerimônias de renascimento.
Ressurreição: ressurgir da existência humana. Este processo não é compreendido no sentido material grosseiro, mas se considera o ressurgir do corpo glorificado, no estado de incorruptibilidade. Mudança de essência, que podemos chamar de transmutação. Trata-se da transformação do ser mortal em um ser imortal, do ser corporal no ser espiritual, do ser humano num ser divino. Um exemplo muito conhecido é o da transfiguração miraculosa de Cristo, ou a subida ao céu da Mãe de Deus com seu corpo, após a morte.
A negação categórica das possibilidades de desenvolvimento acarreta a perda da alma. A alma se foi, tal como um cachorro que foge à noite de seu dono. A tarefa do xamã é então capturar a fugitiva e trazê-la de volta. Muitas vezes a perda ocorre subitamente e se manifesta através de um mal estar geral. Com a perda da alma não se tem mais nenhum desejo ou coragem de enfrentar as tarefas do dia. A pessoa se sente como chumbo porque nenhuma parte do corpo parece disposta a mover-se, e isso é devido ao fato de não haver mais qualquer energia disponível. Estado de desânimo e paralisação da vontade pode aumentar a ponto de a personalidade desmoronar. Surgem campos corporais anestesiados ou amnésia sistemática. Esta última é um fenômeno histérico de perda. Diminui a autoconfiança e a iniciativa. Surge um egocentrismo crescente. Desenvolvimento de uma personalidade essencialmente negativa, que representa uma falsificação em relação à personalidade originária. A perda da alma gera as possessões que podem ser possessão pela “persona”, possessão pelo inconsciente pessoal, possessão pelo inconsciente coletivo, possessão por figuras ancestrais e possessão pela alma grupal.
Possessão: A possessão pela “persona” significa que a psique foi possuída pela cultura dominante, reflete especificamente o meio em que está vivendo. A possessão pelo inconsciente pessoal é quando a psique reflete o lado obscuro da cultura, ou seja, a anticultura. A possessão provocada pelo inconsciente coletivo gera a possessão pela anima ou pelo animus provocando transformações da personalidade, evidenciando os traços do sexo oposto: no homem, manifesta o feminino e, na mulher, o masculino. Anima provoca ação externa com os seguintes aspectos: volúvel, desmedida, caprichosa, descontrolada, emocional, às vezes demoniacamente intuitiva, indelicada, perversa, mentirosa, bruxa e mística. O animus, pelo contrário, é rígido, cheio de princípios, legalistas, dogmático, reformador do mundo, teórico, emaranhando-se em argumentos, polêmico, despótico. A “anima” e o “animus” são cercados de indivíduos medíocres e se prestam a pensamentos medíocres. Os conteúdos das possessões aparecem como convicções singulares, planos obstinados. Não existe linha divisória absoluta entre possessão e paranóia.
Possessões por figuras ancestrais: desencadeada por algo que poderíamos designar mais adequadamente por “alma ancestral” e precisamente como uma determinada alma ancestral. São casos de identificação visível com a persona de pessoas falecidas. Essas possessões nas idades primitivas eram amplamente difundidas.
Possessões pelas almas da natureza: a psique é possuída pela alma da terra, da água, do ar, do fogo, dos vegetais e dos animais.
Possessão pela alma grupal: trata mais exatamente da identificação de um indivíduo com certo grupo humano. Uma vivência grupal ocorre em um nível inferior de consciência. É um fato que, quando muitas pessoas se reúnem para partilhar de uma emoção comum, emerge uma alma conjunta que fica abaixo do nível de consciência de cada um. Quando um grupo é muito grande cria-se um tipo de alma animal coletiva. Envolto na identificação com o grupo não se sente nenhuma responsabilidade, mas também nenhum medo. A pessoa depende continuamente da embriaguez da massa a fim de consolidar a vivência e poder acreditar nela. Cada um sente-se arrastado pela onda coletiva de identificação com os outros. Pode até mesmo ser uma sensação agradável, uma ovelha entre dez mil ovelhas. Quando não está mais na multidão, a pessoa torna-se outro ser, incapaz de reproduzir o estado anterior. Volta a ter o seu nome civil, morando em determinada rua e tendo uma profissão, os problemas pessoais retornam. Diante da vida cotidiana busca novamente penetrar na alma grupal visando sentir novamente uno com o povo, sendo bem melhor do que ser apenas o cidadão x ou y.
Quando não existe afastamento ou fuga da alma ocorrem às mudanças necessárias que denominamos metempsicose, reencarnação, renascimento e ressurreição provocando modificações na psique do indivíduo que reflete diretamente no corpo humano. Lidamos aqui com uma realidade puramente psíquica, que só nos é transmitida indiretamente.  A psique é a realidade mais prodigiosa do mundo humano. Ela é a mãe de todos os fatos humanos, da cultura e da guerra assassina. Tudo isso é primeiramente psíquico e invisível, mas real. As mudanças podem ser as seguintes: mediada pelo rito sagrado; identificação com herói do culto, transformação mágica, transformações baseadas em símbolos místicos, transformação através de ações meditativas, ampliação de consciência e transformações naturais.
Modificação mediada pelo rito sagrado: participação em um rito sagrado que lhe revela a perpetuidade da vida através de transformações e renovações. O participante do rito é influenciado, impressionado ou consagrado por sua simples presença ou participação, a psique modifica por vivenciar a influência recebida.
Modificação mediada com a identificação do neófito com o herói do culto: para a vivência da transformação também é importante a identificação do neófito com o deus ou herói demonstrado no ritual sagrado. A identificação do neófito com o sagrado possibilita transformações psíquicas importantes.
Modificação mediada pelas transformações mágicas: o ritual é intencionalmente usado para produzir uma transformação. Por exemplo: um homem está doente e deve ser “renovado”. A renovação ocorre quando ele é puxado através de um buraco feito na parede na cabeceira de seu leito e quando sai do outro lado do buraco é psicologicamente afetado ocasionando a cura da doença. Ou então recebe outro nome e com este uma nova alma. Desse modo os demônios não o reconhecem mais; ou ainda passar por uma morte figurada, ou então é puxado grotescamente através de uma vaca de couro que o devora pela boca e o expele por trás. Ou ainda, passa por uma ablução ou banho batismal, transformando-se em um ser mais ou menos divino, com um novo caráter e um destino metafísico transformado. Ou se alimenta de uma refeição dita sagrada provocando transformações psicológicas que afetam a estrutura física.
Modificações mediadas por transformações através dos símbolos: 1) a gruta é o lugar do renascimento, aquele espaço oco secreto em que se é encerrado, a fim de ser incubado e renovado. A gruta que cada um tem dentro de si, ou na escuridão que fica por detrás da sua consciência, é envolvido num processo de transformação, a princípio inconsciente. Através dessa entrada no inconsciente ocorre uma conexão da consciência com os conteúdos inconscientes fazendo surgir grandes modificações no sentido positivo ou negativo. 2) Chadir: o novo ser representante do si-mesmo. Nasceu nas trevas de uma gruta. Uma consciência mais elevada. A consciência do eu reage à orientação superior do destino do si-mesmo. Chadir não representa apenas a sabedoria superior, mas também a um modo de agir correspondente a ela, o qual ultrapassa a razão humana. Chadir, o ser imortal. Podemos encontrar o Chadir na rua, sob a forma de um homem ou que ele pode aparecer durante a noite como uma pura luz branca. Durante o sono como sendo uma luz clara. O Chadir pode aparecer como um conselheiro, amigo, consolador e também como mestre de sabedoria revelada. Chadir é o anjo de Deus, Anjo de Face, um mensageiro. 3) Pão e Vinho: (disse Jesus que seu sangue é o vinho e seu corpo o pão) significa provavelmente apenas algo a ser assimilado, quando ocorre a comunhão no catolicismo o fiel psicologicamente assimila ou aceita Jesus. 4)Peixe: influência nutritiva dos conteúdos do si-mesmo, os quais mantêm a vitalidade da consciência através de um influxo energético contínuo, uma vez que a consciência não produz sua própria energia. 
Modificações mediadas pelas ações meditativas: pertencem a este contexto os exercícios meditativos, entrar no vazio ou comunhão com esferas ou seres mais elevados.
Modificação mediada pela ampliação da consciência: assim, pois, se formos tocados por uma grande idéia de fora, devemos compreender que ela só nos toca devido a existência em nosso interior que lhe corresponde e vai ao seu encontro. Apropriamos verdadeiramente de tudo o que vem de fora para dentro, se formos capazes de uma amplitude interna correspondente à grandeza do conteúdo que vem de fora. Sem ampliação das fontes internas jamais será possível captar algo superior a nossa vivência. O ser humano possui dentro de si a capacidade de crescer. O botão se abre em flor e do menor surge o maior, “um torna-se dois”. O maior, que permanecia invisível, comparece diante do homem que fomos até então. O menor vê nascer diante si o amigo pelo qual tanto ansiava. O Cristo é o símbolo supremo do imortal que está oculto no homem mortal. Cristo é o outro que nasceu do menor. O filho de Deus nasce do filho do homem.
Modificações naturais: A própria natureza exige morte e renascimento. Há processos naturais de transformação que nos ocorrem, quer queiramos ou não, saibamos ou não. Trata-se de um processo demorado de transformação interna e do renascimento em outro ser. Este outro ser é o outro em nós, a personalidade futura mais ampla, com a qual já travamos conhecimento como um amigo interno da alma.
Devemos esclarecer que a psique é o ovário que possibilita o nascimento ou florescimento do si-mesmo, ou seja, da alma imortal que viajará em direção a infinitude da existência.

domingo, 14 de novembro de 2010

Atividades Mentais e Imagens Primordiais

Marcos Spagnuolo Souza
Esse artigo é o resumo do capítulo denominado “Aspectos Psicológicos do Arquétipo Materno” do livro “Os Arquétipos e o Inconsciente Coletivo” de JUNG, Carl Gustav.
Podemos salientar que todas as atividades mentais (pensar, a razão, a compreensão, o imaginar), não representam processos autônomos, livres de qualquer condicionamento subjetivo, apenas a serviço das eternas leis da lógica, mas sim funções psíquicas agregadas e subordinadas às imagens primordiais. Nossas próprias tendências filosóficas e até mesmo o que chamamos nossas melhores verdades são afetadas e diretamente ameaçadas pelas imagens primordiais. Podemos perguntar: será possível que um ser humano pode pensar, dizer e fazer o que ele mesmo é?
Para respondermos a referida pergunta devemos dizer que há um fator apriorístico em todas as atividades humanas, que é a estrutura da inconsciência pessoal e inconsciência coletiva (imagens primordiais). A psique, por exemplo, a do recém-nascido, não é de modo algum um nada vazio, ao qual, sob circunstâncias favoráveis, tudo pode ser ensinado. Pelo contrário, ela é uma condição prévia tremendamente complicada e rigorosamente determinada pelo inconsciente coletivo. No entanto, assim que ocorrem as primeiras manifestações visíveis da vida psíquica, só um cego não pode ver o caráter do inconsciente coletivo sendo manifestado na personalidade singular da criança. É impossível supor que todas essas particularidades sejam criadas somente no momento em que aparecem. 
O ser humano possui, como todo animal, uma psique pré-formada de acordo com sua espécie. O tipo específico humano está contido no inconsciente coletivo. A idéia de que a forma humana não é herdada, mas criada de novo em cada ser humano, é tão absurda quanto à concepção primitiva de que o Sol que nasce pela manhã é diferente daquele que se pôs na véspera. O que é herdado não são as idéias, mas as formas, as quais sob esse aspecto particular correspondem aos instintos igualmente determinados por sua forma.
As imagens primordiais (inconsciente coletivo) foram criadas desde o início da espécie, influenciando inclusive a formação humana. Uma vez que tudo o que é psíquico é pré-psíquico, cada uma de suas funções também o é, especialmente as que derivam diretamente das disposições inconscientes. Estas imagens primordiais denominadas de inconsciente coletivo são arquétipos ou modelos energéticos que influenciam toda a psique e também a forma humana.
As imagens primordiais existem em algum lugar celeste. Dentre as inúmeras imagens primordiais existe a imagem primordial denominada “anima”, preexistente e supra-ordenada que influencia diretamente toda estrutura humana.
O arquétipo “anima” possui uma variedade incalculável de formas astrais e mencionamos apenas algumas: a forma de mãe; avó; madrasta e sogra; uma mulher qualquer; ama-de-leite; antepassada; mulher branca; deusa; mãe de Deus, Virgem Maria, Sofia. Em sentido mais amplo: paraíso, reino de Deus, Jerusalém Celeste, Igreja Universal, o Céu, a Terra, a floresta, o mar, as águas quietas; a matéria; o mundo subterrâneo; a Lua; lugar de nascimento ou da concepção, a terra arada, o jardim, a gruta, a árvore, a fonte, o poço profundo, a pia batismal, a flor, círculo mágico, o útero, qualquer forma oco; o forno; o caldeirão; a vaca.
O atributo da anima é maternal; o feminino; a sabedoria; elevação espiritual  bondade; o que cuida; o que sustenta; o que proporciona as condições de crescimento; fertilidade e alimento; o lugar da transformação mágica, do renascimento; o instinto e o impulso favoráveis; o secreto; o oculto; o obscuro; o abissal; o mundo dos mortos; o devorador; sedutor e venenoso; o apavorante e fatal. “Anima” pode aparecer também sob a forma de um animal, de uma bruxa, fantasma, canibal, hermafrodita e coisa deste tipo.
O reflexo da “anima” no corpo masculino ou feminino difere bastante: o efeito típico nos filhos são o homossexualismo, o dom-juanismo e eventualmente também a impotência. No homossexualismo o componente heterossexual fica preso à figura da mãe de modo inconsciente; no dom-juanismo, a mãe é procurada inconscientemente em cada mulher.
A exacerbação do feminino significa uma intensificação de todos os instintos femininos, e em primeiro lugar do instinto materno. O aspecto negativo desta é representado por uma mulher cuja única meta é parir. O homem para ela é algo secundário; sendo essencialmente o instrumento de procriação, classificando como um objeto a ser cuidado. Primeiro, ela leva os filhos no ventre, depois se apega a eles, pois, sem os mesmos não possui nenhuma razão de ser. Este tipo de mulher, embora sempre parecendo sacrificar-se pelos outros, na realidade é incapaz de um verdadeiro sacrifício. Seu instinto materno impõe-se brutalmente até conseguir o aniquilamento da própria personalidade e da de seus filhos. Quanto mais inconsciente de sua personalidade for uma mãe deste tipo, tanto maior e mais violenta será sua vontade de poder inconsciente.
Nossas intenções conscientes são por assim dizer constantemente perturbadas e atravessadas em maior ou menor grau por intrusões inconscientes, cujas causas nos são inicialmente desconhecidas. A psique está longe de ter uma unidade; pelo contrário, ela é uma mistura borbulhante de impulsos, bloqueios e afetos contraditórios e o seu estado conflitivo é, para muitas pessoas, tão insuportável, que elas desejam a salvação apregoada pela teologia. 

domingo, 7 de novembro de 2010

O Inconsciente Coletivo e Suas Projeções

Marcos Spagnuolo Souza
Esse artigo é o resumo do capítulo denominado “O Arquétipo Com Referência Especial ao conteúdo de Anima” do livro “Os Arquétipos e o Inconsciente Coletivo” de JUNG, Carl Gustav.
O inconsciente coletivo deve ser considerado como uma realidade autônoma de caráter enigmático, possuindo uma essência diferente dos processos físico-químicos, escapando aos caprichos e manipulações da consciência. Do inconsciente coletivo emanam influências determinantes.
Um dos arquétipos do inconsciente coletivo é a anima e o animus, sendo representado pelos pares divinos (masculino-feminino), yang (masculino) e yin (feminino), o panteão politeísta da antiguidade. O animus e anima é apenas um dos possíveis pares de opostos existentes no inconsciente coletivo, mas na prática é um dos mais importantes e freqüentes.
Os arquétipos do inconsciente coletivo podem permanecer em estado de repouso, isto é, não projetado, não possui forma determinável, constituindo uma estrutura formalmente indefinida, mas com a possibilidade de manifestar-se em formas determinadas, através da projeção.
Um dos casos mais instrutivos de projeção do arquétipo do inconsciente é o do místico suíço Nicolau de Flue, cujas visões as divindades aparecem numa forma dual: ora como pai majestoso, ora como mãe majestosa. Fato semelhante ocorreu nas visões de Guillaume de Digulleville, pois, ele via Deus no mais alto dos céus sentado num trono radiante e redondo, como um Rei; a seu lado, a Rainha do céu está sentada num trono semelhante de cristal marrom.
Na projeção, a anima assume uma forma feminina, com determinadas características e o animus projeta em uma forma masculina. Quando a anima é projetada no homem ele fica excessivamente sensível, irritável, de humor instável, ciumento, vaidoso e desajustado. Ele vive num estado de mal-estar consigo mesmo e o irradia a toda volta. O homossexualismo se caracteriza por uma identificação do homem com a anima.

segunda-feira, 1 de novembro de 2010

Os Arquétipos e o Inconsciente Coletivo

Marcos Spagnuolo Souza

Esse artigo é o resumo do capítulo denominado “Sobre os Arquétipos do Inconsciente Coletivo” do livro “Os Arquétipos e o Inconsciente Coletivo” de JUNG, Carl Gustav.
Inconsciente: 
Os indivíduos não esquecem quem eles são (sujeitos) e não podem em hipótese alguma perder a consciência. Os indivíduos mantém firmemente ancorados na terra, desconhecendo o inconsciente. Todo o esforço da humanidade concentra-se na consolidação da consciência.
Na consciência, somos nossos próprios senhores, mas se ultrapassarmos o pórtico da consciência, percebemos aterrorizados que somos objetos do inconsciente. Saber isso é decididamente desagradável, pois nada decepciona mais do que a descoberta de nossa insuficiência.
O inconsciente é o estado dos conteúdos reprimidos ou esquecidos. Espaço de concentração dos conteúdos esquecidos e recalcados. Uma camada superficial do inconsciente é pessoal (Inconsciente Pessoal).
Os deuses são fatores psíquicos, ou seja, modelos do inconsciente.
Para nós, tratar com o inconsciente é uma questão vital. Todos aqueles que já tiveram experiências com o inconsciente sabem que o tesouro jaz no fundo da água e tentam retirá-lo de lá.
Sombra
O encontro consigo mesmo pertence às coisas desagradáveis que evitamos, enquanto pudermos projetar o negativo a nossa volta. Se formos capazes de ver nossa própria sombra, e suportá-la, sabendo que existe,teria resolvido apenas uma pequena parte do problema.
A sombra é uma parte viva da personalidade e por isso quer comparecer de alguma forma. Não é possível anulá-la argumentando, ou torná-la inofensiva através da racionalização. No entanto, mais cedo ou mais tarde, as contas terão que ser acertadas. A sombra é, no entanto, um desfiladeiro, um portal estreito cuja dolorosa exigüidade não poupa quem quer que desça ao poço profundo.
Inconsciente Coletivo
O inconsciente pessoal repousa sobre uma camada mais profunda, que já não tem sua origem em experiências ou aquisições pessoais, sendo inata. A camada mais profunda é o que chamamos inconsciente coletivo, não sendo de natureza individual, mas universal; possuindo conteúdos e modos de comportamentos que são os mesmos em toda parte e em todos os indivíduos, substrato psíquico comum de natureza psíquica suprapessoal que existe em cada indivíduo.
Os conteúdos do inconsciente coletivo são formados por imagens (emoções) universais que existiram desde os tempos mais remotos. O inconsciente coletivo é encontrado nos ensinamentos esotéricos, nos mitos e nos contos de fada que são expressões simbólicas do drama interno e inconsciente que a consciência consegue apreender através de suas projeções. Os ensinamentos secretos procuram captar os acontecimentos invisíveis do inconsciente. Os ensinamentos secretos contêm uma sabedoria revelada, originalmente oculta, e exprimem os segredos do inconsciente. As figuras do inconsciente sempre foram expressas através de imagens protetoras e curativas, e assim expelidas da psique para o espaço cósmico.
O inconsciente coletivo é tudo, menos um sistema pessoal encapsulado, é objetivamente amplo com o mundo e aberta ao mundo. Lá eu estou na mais direta ligação com o mundo, de forma que facilmente esqueço quem sou na realidade. Perdido em si mesmo é uma boa expressão para caracterizar este estado.
Quando o inconsciente nos toca e já o somos. Uma onda do inconsciente pode facilmente nos arrebatar e esquecemos quem somos e passamos a fazer coisas nas quais que desconhecemos. A consciência submerge com facilidade no inconsciente, dando espaço à possessão.
Quem olha dentro da água vê sua própria imagem, mas atrás dele surgem seres vivos; possivelmente peixes, habitantes inofensivos da profundeza – inofensivos se o indivíduo não fosse mal-assombrado para muita gente. Trata-se de seres aquáticos de um tipo especial. Às vezes, o pescador apanha uma ninfa em sua rede, um peixe feminino, semi-humano. A sereia é um estágio ainda mais instintivo de um ser mágico feminino, que designamos pelo nome de anima. Também podem ser ondinas, melusianas, ninfas do bosque, graças ou filhas do rei dos Elfos, lâminas e súcubus que atordoam os jovens, sugando-lhes a vida. Essas figuras seriam projeções de estados emocionais nostálgicos e de fantasias condenáveis, dirá o crítico moralista. Impossível não admitir que esta constatação é de certa forma verdadeira. Será a sereia apenas um produto de um afrouxamento moral? Não existiram tais seres em épocas remotas, em que a consciência humana nascente ainda se encontrava por inteiro ligado à natureza? Seguramente devem ter existido primeiro os espíritos na floresta, no campo, nos cursos de água, muito antes dos questionamentos da consciência moral. Além disso, esses seres eram tão temidos como sedutores, de modo que seus estranhos encantos eróticos não passavam de características parciais. A consciência era, então, bem mais simples e o domínio sobre ela absurdamente pequeno. Uma quantidade infinita do que agora sentimos como parte integrante de nossa própria natureza psíquica ainda volteia alegremente em torno do homem primitivo em amplas projeções.
O inconsciente coletivo não se desenvolve individualmente, mas é herdado. Ele consiste de formas preexistentes, arquétipos, que só secundariamente podem tornar-se conscientes, conferindo uma forma definida aos conteúdos da consciência.
Arquétipos: Os conteúdos do inconsciente coletivo são chamados arquétipos. O conceito de arquétipo só se aplica às representações coletivas, conteúdos psíquicos que ainda não foram submetidos a qualquer elaboração consciente. Os arquétipos se modificam através da conscientização assumindo matizes que variam de acordo com cada consciência individual.
Os arquétipos aparecem como personalidades atuantes em sonhos e fantasias.
O perigo principal é sucumbir à influência fascinante dos arquétipos, o que pode acontecer mais facilmente quando as imagens arquetípicas não são conscientizadas. Caso exista uma predisposição psicótica pode acontecer que as figuras arquetípicas escapem ao controle da consciência, alcançando uma total independência, ou seja, gerando fenômenos de possessão. No caso de uma possessão pela anima, por exemplo, o paciente quer transformar-se por autocastração numa mulher chamada Maria.
O que não consegue mais controlar o inconsciente. Em todo caso de dissociação é, portanto, necessário integrar o inconsciente na consciência. Trata-se de um processo sintético que denominei processo de individuação.
O método terapêutico da psicologia complexa consiste por um lado numa tomada de consciência, o mais completa possível, dos conteúdos inconscientes constelados.
Uma vez que os arquétipos são relativamente autônomos como todos os conteúdos numinosos, não se pode integrá-los simplesmente pro meios racionais, mas requerem um processo dialético, isto é, confronto propriamente dito que muitas vezes é realizado pelo paciente em forma de diálogo.
Há boas razões para supormos que os arquétipos sejam imagens inconscientes dos próprios instintos, representam o modelo básico do comportamento instintivo. Os instintos são forças motrizes especificamente formadas, que perseguem suas metas inerentes antes de toda conscientização, independente do grau de consciência. Podemos admitir sem hesitação que a atividade humana é em grande escala influenciada por instintos.
A fonte principal para compreender os arquétipos está nos sonhos, que têm a vantagem de serem produtos espontâneos da psique inconsciente, independentemente da vontade, sendo, por conseguinte, produtos da natureza, puros e não influenciados por qualquer intenção consciente. Outra fonte de acesso ao arquétipo são as seqüências de fantasias.
Há boas razões para supormos que os arquétipos sejam imagens inconscientes dos próprios instintos, representam o modelo básico do comportamento instintivo.
Como poderemos provar a existência dos arquétipos? A fonte principal está nos sonhos, que têm a vantagem de serem produtos espontâneos da psique inconsciente, independentemente da vontade, sendo, por conseguinte, produtos da natureza, puros e não influenciados por qualquer intenção consciente. Outra fonte de acesso ao material necessário é a imaginação. Entende-se como sendo uma sequência de fantasias que é gerada pela concentração intencional. A intensidade e a frequência dos sonhos são reforçadas pela presença de fantasias inconscientes e inapreensíveis e que quando estas emergem na consciência o caráter dos sonhos se transforma tornando-os mais fracos e menos freqüentes. O sonho muitas vezes contém fantasias tendentes a se tornarem conscientes. A sequência de fantasias que vêm a tona alivia o inconsciente e representa um material rico de formas arquetípicas.
Anima
O confronto com a sombra é obra do aprendiz, o confronto com a anima é a obra-prima A relação com a anima é outro teste de coragem, uma prova de fogo para as forças espirituais e morais do homem. Jamais devemos esquecer que, em se tratando da anima, estamos lidando com realidades psíquicas, as quais até então nunca foram apropriadas pelo homem, uma vez que se mantinham fora de seu âmbito psíquico, sob a forma de projeção.
Anima é algo que vive por si mesma e que nos faz viver; é uma vida por detrás da consciência, que nela não pode ser completamente integrada, mas da qual pelo contrário esta última emerge. Embora pareça que a totalidade da vida anímica inconsciente pertence à anima, esta é apenas um arquétipo entre muitos. Por isso, ela não é a única característica do inconsciente, mas um de seus aspectos. A imagem da anima é geralmente projetada em mulheres. Tudo que é tocado pela anima torna-se numinoso, isto é, incondicional, perigoso, tabu, mágico. Ela é a serpente do paraíso do ser humano inofensivo e, cheio de bons propósitos e intenções. Destroi inibições morais e desencadeia forças que seria melhor permanecerem inconscientes. Anima quer vida, ela quer o bom e o mau. A anima é conservadora e se prende à humanidade mais antiga de um modo exasperante. Ela prefere aparecer em roupagens históricas, com predileção pela Grécia e pelo Egito. Essa mesma anima pode aparecer como um anjo de luz, como psicopompos, e conduzi-lo até o significado mais alto.
Anima não deixa de ser um impulso caótico da vida, mas ao lado disso é também algo extremamente significativo; um saber secreto ou uma sabedoria oculta, algo que curiosamente contrasta com a sua natureza élfica irracional.
Quanto mais o indivíduo conscientiza da anima, tanto mais ela perde seu caráter impetuoso e compulsivo. Pouco a pouco o indivíduo vai criando conscientemente os diques para evitar a inundação do caos e assim surge um novo cosmo. Não se trata de uma nova descoberta da psicologia, mas de uma verdade milenar, da riqueza da experiência da vida vem o ensinamento que o pai transmite ao filho.
O Velho Sábio
O mago é sinônimo do velho sábio, que remonta diretamente à figura do xamã a sociedade primitiva. Como a anima, ele é um daimon imortal que penetra com a luz do sentido a obscuridade caótica da vida. Ele é o iluminador, o professor e mestre, o guia das almas de cuja personificação nem Nietzsche, o destruidor das tábuas da Lei pôde escapar. Nietzsche invocou, através de sua reencarnação no Zaratustra, o espírito superior de uma idade quase homérica, para tornar-se portador e porta-voz de sua própria iluminação e êxtase dionisíaco.
Arquétipos de Transformação
Estes não são personalidades, mas sim situações típicas, lugares e caminhos simbolizando cada qual um tipo de transformação. Tal como as personalidades, estes arquétipos também são símbolos verdadeiros. Os princípios fundamentais são indescritíveis, dada a riqueza de referências, apensar de serem reconhecíveis. O intelecto discriminador sempre procura estabelecer o seu significado unívoco e perde o essencial, pois a única coisa que é possível constatar e que corresponde à sua natureza é a multiplicidade de sentido, a riqueza de referência quase ilimitada que impossibilita toda e qualquer formulação unívoca. Seu início é quase sempre caracterizado por um beco sem saída ou qualquer outra situação impossível; sua meta,em amplo sentido, é a iluminação ou consciência superior, através do qual a situação inicial é superada num nível superior.
Por volta de 1906 deparei (Jung) com a curiosa fantasia de um indivíduo internado há muitos anos. Encontrei-o junto à janela, movendo a cabeça de um lado para outro, piscando para o Sol. Pediu-me que fizesse o mesmo, prometendo que eu veria algo muito importante. Ao perguntar-lhe o que estava vendo, ele espantou-se porque eu nada via, e disse: “O senhor está vendo o pênis do Sol. Quando movo a cabeça de um lado para outro ele também se move e esta é a origem do vento”. Cerca de quatro anos depois, ao estudar mitologia, descobri um livro que comentava um papiro grego da liturgia mitraica que dizia: “Procura nos raios a respiração, inspira três vezes tão fortemente quanto puderes e sentir-te ás erguido e caminhando para o alto, de forma que acreditarás estar no meio de região aérea. O caminho dos deuses visíveis aparecerá através do Sol, o Deus, meu pai; do mesmo modo, ficará visível o assim chamado tubo, a origem do vento propiciatório. Pois verás pendente do disco solar algo semelhante a um tubo. E rumo às regiões do oeste, um contínuo vento leste; se o outro vento prevalecer em direção ao leste, verá, de modo semelhante, a face movendo-se nas direções do vento.”
Experiência relacionada com a divindade: a experiência original da divindade ocorre através do êxtase e pode ser tão terrível que transfigura o rosto de quem passa pela experiência. Bruder Klaus: a visão que aparecera era tão terrível que seu próprio rosto se desfigurou de tal modo que as pessoas se assustavam, temendo-o. Ele se defrontou com uma visão de máxima intensidade. Todos os que se aproximavam dele ficaram assustados. Sobre a causa deste terror, ele mesmo costumava dizer que havia visto uma luz penetrante, representando um semblante humano. Ao visualizá-lo temera que seu coração explodisse em estilhaços. Por isso, tomado de pavor, desviara o rosto, caindo por terra. (Ângelo Silêsio. Jacob Bohme).
Instintos
Instinto: os instintos são comuns nos animais e aos homens. Os instintos são fatores impessoais universalmente difundidos e hereditários, de caráter mobilizador, que muitas vezes se encontram tão afastados do limiar da consciência, que a moderna psicoterapia se vê adiante da tarefa de ajudar o paciente a tomar consciência dos mesmos. São forças motrizes especificamente formadas, que perseguem suas metas inerentes antes de toda conscientização, independente do grau de consciência. Podemos admitir sem hesitação que a atividade humana é em grande escala influenciada por instintos.
A fonte da imaginação são instintos reprimidos, cuja tendência natural é influenciar a mente consciente. Em casos desse tipo entregamos ao paciente a tarefa de contemplar cada fragmento de sua fantasia que lhe parece associativo em que está contido, até poder compreendê-lo.
Bibliografia
JUNG, Carl Gustav. Os arquétipos e o inconsciente coletivo. Petrópolis: Editora Vozes, 2002.